sábado, 29 de agosto de 2009

confianzas


se sienta a la mesa y escribe
con este poema no tomarás el poder
con estos versos no harás la Revolución
ni con miles de versos harás la Revolución
y más: esos versos no han de servirle para
que peones maestros hacheros vivan mejor
coman mejor o él mismo coma viva mejor
ni para enamorar a una le servirán
no ganará plata con ellos
no entrará al cine gratis con ellos
no le darán ropa por ellos
no conseguirá tabaco o vino por ellos
ni papagayos ni bufandas ni barcos
ni toros ni paraguas conseguirá por ellos
si por ellos fuera a la lluvia lo mojará
no alcanzará perdón o gracia por ellos
con este poema no tomarás el poder
con estos versos no harás la Revolución
ni con miles de versos harás la Revolución
se sienta a la mesa y escribe

http://www.youtube.com/watch?v=0f7UPTz4KeU&feature=related

sexta-feira, 28 de agosto de 2009

Não há complacência!

"Após a Revolução de Outubro, os bolcheviques tratam os generais do czar com generosidade. Coisa muito pouco conhecida pelos historiadores burgueses.

'A revolução cometeu o erro de mostrar-se complacente com o líder do ataque cossaco (general Krasnov). Ele poderia ter sido fuzilado. Após alguns dias, recuperou sua liberdade, depois de dar sua palavra de honra de que nunca mais pegaria em armas contra a revolução. Porém, que valor pode ter promessas de honra para os inimigos da pátria e da propriedade? Ele se foi para incendiar e dizimar a região de Don.'"

(Victor Serge)

Fonte: Conheça Trotsky – Tariq Ali e Phill Evans

as pessoas mudam

"Todos os trabalhos de organização prática da insurreição foram colocados sob a direção imediata do presidente do Soviet de Petrogrado, o camarada Trotsky. Podemos dizer com certeza que o partido deve a rápida adesão das tropas para o lado dos soviets e o trabalho preciso do Comitê Militar Revolucionário, acima de tudo e principalmente, ao camarada Trotsky."

Acreditem ou não, Joseph Stálin em 1917.
As pessoas mudam, infelizmente, muitas vezes pra pior.



Fonte: Conheça Trotsky – Tariq Ali e Phill Evans
Imagem: Stalin jovem em 1902 – eu sei que o cara é do mau, mas que “pão” ^^

O capitalismo não é de quem trabalha!

...

A gente sempre se perde quando se entrega demais, de coração, com sinceridade - em qualquer coisa. O mundo é anti-ético, crianças!

quarta-feira, 26 de agosto de 2009

Interpol

Stella Was A Diver And She Was Always Down


When she walks down the street,
She knows there's people watching.
The building fronts are just fronts
To hide the people watching her

But she once fell through the street
Down a manhole in that bad way
The underground drip
Was just like her scuba days

Days
Daze
Days
Daze

She was all right because the sea was so airtight, she broke away
She is all right but she can't come out tonight, she broke away
She was all right, yeah the sea was so tight, air tight
She broke away, broke away

At the bottom of the ocean she dwells
At the bottom of the ocean she dwells
From crevices caressed by fingers
And fat blue serpent swells
Stella, Stella, Stella, Stella I love you

Well, she was my catatonic sex toy, love-joy diver
She went down down down there into the sea,
Yeah she went down down down there, down there for me, right on

So good, oh yeah, right on

There's something that's invisible,
There's some things you can't hide,
Try detect you when I'm sleeping,
In a wave you say goodbye...

o velho leon e natália em coyoacán

o velho leon e natália em coyoacán

desta vez não vai ter neve como em petrogrado aquele dia
o céu vai estar limpo e o sol brilhando
você dormindo e eu sonhando

nem casacos nem cossacos como em petrogrado aquele dia
apenas você nua e eu como nasci
eu dormindo e você sonhando

não vai mais ter multidões gritando como em petrogrado aquele dia
silêncio nós dois murmúrios azuis
eu e você dormindo e sonhando

nunca mais vai ter um dia como em petrogrado aquele dia
nada como um dia indo atrás de outro vindo
você e eu sonhando e dormindo

(Paulo Leminsky)

Obs. sugerido via Orkut pelo amigo Neandro

sem feminismo, não há socialismo


Quando os homens querem atacar uma mulher dentro da militância, sempre apelam em último caso de forma COVARDE pra moral, porque sabem que a sociedade machista ainda tem as mulheres como dadas à sentimentalismos e fofocas além de serem facilmente incriminadas por práticas sexuais ou de comportamento que não incriminam os homens quando cometidas por estes.
"O levantamento das massas não é feito. Ele mesmo se faz, de acordo com suas próprias vontades."

(Trotsky)

não poder separar as idéias dos homens


"Na verdade, os marxistas - especialmente na Rússia - estavam prontos a defender suas posições com franqueza absoluta. Porém, via de regra, eles abstiveram-se dos ataques pessoais. O crime de Trotsky contra essa regra não pode ser explicado somente pela efervecência da juventude - exibia agora característica que não mais o deixaria: não poder separar as idéias dos homens."

(Isac Deutscher)

domingo, 23 de agosto de 2009

novas técnicas de como dar prazer infalível a uma mulher:

Em geral os conselhos relacionados ao assunto raramente rendem o sucesso esperado. Mas não é o caso destas cinco técnicas infalíveis. Quer deixar sua parceira "louquinha" de prazer? Comece seguindo estes conselhos.

(Atenção: Segredos revelados por uma mulher.)

Técnica nº1: Mãos Molhadas

Sim, a técnica das mãos molhadas. Certamente a mais popular entre as mulheres. Tão simples. Tão excitante. Você vai deixá-la sem fôlego:

* Faça sua parceira sentar-se em uma cadeira confortável na cozinha. Certifique-se que ela consegue ver muito bem tudo que você faz.
* Encha a pia da cozinha com água e adicione algumas gotas de detergente para louça com aroma. (Existem muitos aromas que podem ser utilizados -maçã, limão, lavanda - escolha o que quiser. Se estiver em dúvida, experimente o 'neutro').
* Segurando uma esponja macia, submerja suas mãos na água e sinta sua pele ser envolvida pelo líquido até que a esponja esteja bem molhada..
* Agora, movendo-se devagar e gentilmente, pegue um prato sujo do jantar, coloque-o dentro da pia e esfregue a esponja em toda a superfície do prato. Vá esfregando com movimentos circulares até que o prato esteja limpo.
* Enxague o prato com água limpa e coloque-o para secar. Repita com toda a louça do jantar até que sua parceira esteja gemendo de prazer.

Técnica nº2: Vibrando pela Sala

Esta técnica utiliza o que para muitas mulheres é considerado um "brinquedinho". É um pouco mais difícil do que a primeira, mas com algum treino você vai fazer com que sua parceira grite de prazer.

* Cuidadosamente apanhe o aspirador de pó no lugar onde ele fica guardado. Seja gentil, demonstre a ela que você sabe o que está fazendo.
* Ligue-o na tomada, aperte os botões certos na ordem correta.
* Vagarosamente vá movendo-se para frente e para trás, para frente e para trás... por todo o carpete da sala. Você saberá quando deve passar para uma nova área.
* Vá mudando gradativamente de lugar. Repita quantas vezes seja necessário até atingir os resultados.

Técnica n°3: A Camiseta Molhada

Este joguinho é bem fácil, embora você precise de mente rápida e reflexos certeiros. Se você for capaz de administrar corretamente a agitação e a vibração do processo, sua parceira falará de sua perfomance a todas as amigas dela.

* Você precisará de duas pilhas de roupas sujas. Uma com as roupas brancas, e outra com as coloridas.
* Encha a máquina de lavar com água e vá derramando gentilmente o sabão em pó dentro dela (para deixar a mulher ofegante, use exatamente a quantidade recomendada pelo fabricante).
* Agora, sensualmente coloque as roupas brancas na máquina... uma de cada vez.... devagar. Feche a tampa e ligue o 'ciclo completo'.
* Enquanto você vê sua companheira babar de desejo por você, essa é uma ótima oportunidade para pôr em prática a Técnica nº2.
* Ao fim do ciclo, retire as roupas da máquina e estenda-as para secar. Repita a operação com as roupas coloridas..

Atenção: Se nesse ponto ela começar a gritar algo como: - "Sim! Sim! Ai! Isso! Ai mesmo! Oh meu Deus! Não pára! Não pára não!" Não pare. Continue até que ela esteja exausta de prazer.

Técnica nº4: O que sobe, desce

Esta é uma técnica muito rapidinha. Para aqueles momentos em que você quer surpreendê-la com um toque de satisfação e felicidade. Pode ter certeza, ela não vai resistir.

* Ao ir ao banheiro, levante o assento do vaso. Ao terminar, abaixe novamente.
* Faça isso todas as vezes.
* Ela vai precisar de atendimento médico de tanto prazer.

Técnica nº5: Gratificação Total

Cuidado: colocar em prática esta técnica pode levar sua companheira a um tal estado de sublimação que será difícil depois acalmá-la, podendo causar riscos irreversíveis a saúde da mulher.

* Esta técnica leva algum tempo para aperfeiçoar. Empenhe-se com afinco. Experimente sozinho algumas vezes durante a semana e tente surpreendê-la numa sexta-feira à noite. Funciona melhor se ela trabalha fora e chega cansada em casa.
* Aprenda a fazer uma refeição completa. Seja bom nisso.
* Quando ela chegar em casa, convença-a a tomar um banho relaxante (de preferência aromático em uma banheira de água morna que você já preparou).
* Enquanto ela está lá, termine o jantar que você já adiantou antes dela chegar em casa.
* Após ela estar relaxada pelo banho e saciada pelo jantar, proceda com a Técnica nº1.
* Preste atenção nela pois o estado de satisfação será extremamente alto, podendo causar coma repentino.

Obs. achou que era putaria né? >:D

Os limites do capital são os limites da Terra - Leonardo Boff

Em 1961 precisávamos de metade da Terra para atender as demandas humanas. Em 1981 empatávamos: precisávamos de um Terra inteira. Em 1995 já ultrapassamos em 10% de sua capacidade de regeneração, mas era ainda suportável. Em 2008 passamos de 40% e a Terra está dando sinais inequívocos de que já não agüenta mais. Se mantivermos o crescimento do PIB mundial entre 2-3% ao ano, em 2050 vamos precisar de duas Terras, o que é impossível. A análise é de Leornado Boff, em seu artigo de estréia como colunista da Carta Maior.

Uma semana após o estouro da bolha econômico-financeira , no dia 23 de setembro, ocorreu o assim chamado Earth Overshoot Day , quer dizer, "o dia da ultrapassagem da Terra". Grandes institutos que acompanham sistematicamente o estado da Terra anunciaram: a partir deste dia o consumo da humanidade ultrapassou em 40% a capacidade de suporte e regeneração do sistema-Terra. Traduzindo: a humanidade está consumindo um planeta inteiro e mais 40% dele que não existe. O resultado é a manifestação insofismável da insustentabilidade global da Terra e do sistema de produção e consumo imperante. Entramos no vermelho e assim não poderemos continuar porque não temos mais fundos para cobrir nossas dívidas ecológicas.

Esta notícia, alarmante e ameaçadora, ganhou apenas algumas linhas na parte internacional dos jornais, ao contrário da outra que até hoje ocupa as manchetes dos meios de comunicação e os principais noticiários de televisão. Lógico, nem poderia ser diferente. O que estrutura as sociedades mundiais, como há muitos anos o analisou Polaniy em seu famoso livro A Grande Transformação, não é nem a política nem a ética e muito menos a ecologia, mas unicamente a economia. Tudo virou mercadoria, inclusive a própria Terra. E a economia submeteu a si a política e mandou para o limbo a ética.

Até hoje somos castigados dia a dia a ler mais e mais relatórios e análises da crise econômico-financeira como se somente ela constituisse a realidade realmente existente. Tudo o mais é secundarizado ou silenciado.

A discussão dominante se restringe a esta questão: que correções importa fazer para salvar o capitalismo e regular os mercados? Assim poderíamos continuar as usual a fazer nossos negócios dentro da lógica própria do capital que é: quanto posso ganhar com o menor investimento possível, no lapso de tempo mais curto e com mais chances de aumentar o meu poder de competição e de acumulação? Tudo isso tem um preço: a delapidação da natureza e o esquecimento da solidariedade generacional para com os que virão depois de nós. Eles precisam também satisfazer suas necessidades e habitar um planeta minimamente saudável. Mas esta não é a preocupação nem o discurso dos principais atores econômicos mundiais mesmo da maioria dos Estados, como o brasileiro que, nesta questão, é administrado por analfabetos ecológicos.

Poucos são os que colocam a questão axial: afinal se trata de salvar o sistema ou resolver os problemas da humanidade? Esta é constituída em grande parte por sobreviventes de uma tribulação que não conhece pausa nem fim, provocada exatamente por um sistema econômico e por políticas que beneficiam apenas 20% da humanidade, deixando os demais 80% a comer migualhas ou entregues à sua própria sorte.. Curiosamente, as vitimas que são a maioria sequer estão presentes ou representadas nos foros em que se discute o caos econômico atual. E pour cause, para o mercado são tidos como zeros econômicos, pois o que produzem e o que consomem é irrelevante para contabilidade geral do sistema.

A crise atual constitui uma oportunidade única de a humanidade parar, pensar, ver onde se cometeram erros, como evitá-los e que rumos novos devemos conjuntamente construir para sair da crise, preservar a natureza e projetar um horizonte de esperança, promissor para toda a comunidade de vida, incluídas as pessoas humanas. Trata-se sem mais nem menos de articular um novo padrão de produção e de consumo com uma repartição mais equânime dos benefícios naturais e tecnológicos, respeitando a capacidade de suporte de cada ecosistema, do conjunto do sistema-Terra e vivendo em harmonia com a natureza.

Milkahil Gorbachev, presidente da Cruz Verde Internacional e um dos principais animadores da Carta da Terra, grupo o qual pertenço, advertiu recentemente: Precisamos de um novo paradigma de civilização porque o atual chegou ao seu fim e exauriu suas possibilidades. Temos que chegar a um consenso sobre novos valores. Em 30 ou 40 anos a Terra poderá existir sem nós.

A busca de um novo paradigma civilizatório é condição de nossa sobrevivência como espécie. Assim como está não podemos continuar. Na última página de seu livro A era dos extremos diz enfaticamente Eric Hobsbawm: Nosso mundo corre o risco de explosão e de implosão. Tem de mudar. E o preço do fracasso, ou seja, a alternativa para a mudança da sociedade é a escuridão.

Importa entender que estamos enredados em quatro grandes crises: duas conjunturais – a econômica e a alimentar – e duas estruturais – a energética e a climática. Todas elas estão interligadas e a solução deve ser includente. Não dá para se ater apenas à questão econômica, como é predominante nos dabates atuais. Deve-se começar pelas crises estruturais pois que se não forem bem encaminhadas, tornarão insustentáveis todas as demais.

As crises estruturais, portanto, são as que mais atenção merecem. A crise energética revela que a matriz baseada na energia fóssil que movimenta 80% da máquina produtiva mundial tem dias contados. Ou inventamos energias alternativas ou entraremos em poucos anos num incomensurável colapso.

A crise climática possui traços de tragédia. Não estamos indo ao encontro dela. Já estamos dentro dela. A Terra já começou a se aquecer. A roda começou a girar e nao há mais como pará-la, apenas diminuir sua velocidade ao minimizar seus efeitos catastróficos e ao adaptar-se a ela. Bilhões e bilhões de dólares devem ser investidos anualmente para estabilzar o clima entorno de 2 a 3 graus Celsius já que seu aquecimento poderá ficar entre 1,6 a 6 graus, o que poderia configurar uma devastação gigantesca da biodiversidade e o holocausto de milhões de seres humanos.

De todas as formas, mesmo mitigado, este aquecimento vai produzir transtornos significativos no equilíbrio climático da Terra e provocar nos próximos anos cerca de 150-200 milhões de refugiados climáticos segundo dados fornecidos pelo atual Presidente da Assembléia Geral da ONU, Miguel d'Escoto, em seu discurso inaugural em meados de outubro de 2008. E estes dificilmente aceitarão o veredito de morte sobre suas vidas. Romperão fronteiras nacionais, desestabilizando politicamente muitas nações.

Estas duas crises estruturais vão inviabilizar o projeto do capital. Ele partia do falso pressuposto de que a Terra é uma espécie de baú do qual podemos tirar recursos indefinidamente. Hoje ficou claro que a Terra é um planeta pequeno, velho e limitado que não suporta um projeto de exploração ilimitada..

Em 1961 precisávamos de metade da Terra para atender as demandas humanas. Em 1981 empatávamos: precisávamos de um Terra inteira. Em 1995 já ultrapassamos em 10% de sua capacidade de regeneração, mas era ainda suportável. Em 2008 passamos de 40% e a Terra está dando sinais inequívocos de que já não agüenta mais. Se mantivermos o crescimento do PIB mundial entre 2-3% ao ano, em 2050 vamos precisar de duas Terras, o que é impossível. Mas não chegaremos lá. Resta ainda lembrar que entre 1900 quando a humanidade tinha 1,6 bilhões de habitantes e 2008 com 6,7 bilhões, o consumo aumentou 16 vezes. Se os paises ricos quissessem generalizar para toda a humanidade o seu bem-estar - cálculos já foram feitos - iríamos precisar de duas Terras iguais a nossa.

A crise de 1929 dava por descontada a sustentabilidade da Terra. A nossa não pode mais contar com este fato e com a abundancia dos recursos naturais. Nenhuma solução meramente econômica da crise pode suprir este déficit da Terra. Não considerar este dado torna a análise manca naquilo que é a determinação fundamental e a nova centralidade.

Tudo isso nos convence de que a crise do capital não é crise cíclica. É crise terminal. Em 300 anos de hegemonia praticamente mundial, esse modo de produção com sua expressão política, o liberalismo, destruiu com sua voracidade desenfreada, as bases que o sustentam: a força de trabalho, substituindo- a pela máquina e a natureza devastando-a a ponto de ela não conseguir, sozinha, se auto-regenerar. Por mais estragemas que seus ideólogos vindos da tradição marxiana, keneysiana ou outras tentem inventar saídas para este corpo moribundo, elas não seráo capazes de reanimáa-lo. Suas dores não são de parto de um novo ser mas dores de um moribundo. Ele não morrerá nem hoje nem amanhã. Possui capacidade de prolongar sua agonia mas esgotou sua virtualidadae de nos oferecer um futuro dicernível. Quem o está matando não somos nós, já que não nos cabe matá-lo mas superá-lo, na boa tradição marxiana bem lembrada por Chico Oliveria em sua lúcida entrevista, mas a própria natureza e a Terra.

Repetimos: os limites do capitalismo são os limites da Terra. Já encostamos nestes limites tanto da Terra quanto do capitalismo. A continuar seremos destruídos por Gaia pois ela, no processo evolucionário, sempre elimina aquelas espécies que de forma persistente e continuada ameaçam a todas as demais. Nós, homo sapiens e demens, nos fizemos, na dura expressão do grande biólogo E. Wilson, o Satã da Terra, quando nossa vocação era o de sermos seu cuidador, guardião e anjo bom.

Para onde iremos? Nem o Papa nem o Dalai Lama, nem Barack Obama nem muito menos os economistas nos poderão apontar uma solução. Mas pelo menos podemos indicar uma direção. Se esta estiver certa, o caminho poderá fazer curvas, subir e descer e até conhecer atalhos, esta direção nos levará a uma terra na qual os seres humanos podem ainda viver humananente e tratar com cuidado, com compaixão e com amor a Terra, Pacha Mama, Nana e nossa Grande Mãe.

Esta direção, como tantos outros já o assinalaram, se assenta nestes cinco eixos: (1) um uso sustentável, responsável e solidário dos limitados recursos e serviços da natureza; (2) o valor de uso dos bens deve ter prioridade sobre seu valor de troca; (3) um controle democrático deve ser construído nas relações sociais, especialmente sobre os mercados e os capitais especulativos; (4) o ethos mínimo mundial deve nascer do intercâmbio multicultural, dando ênfase à ética do cuidado, da compaixão, da cooperação e da responsabilidade universal; (5) a espiritualidade, como expressão da singularidade humana e não como monopólio das religiões, deve ser incentivada como uma espécie de aura benfazeja que acompanha a trajetória humana, pois ancora o ser humano e a história numa dimensão para além do espaço e do tempo, conferindo sentido à nossa curta passagem por este pequeno planeta.

Devemos crer, como nos ensinam os cosmólogos contemporâneos, nas virtualidades escondidas naquela Energia de fundo da qual tudo provém, que sustenta o universo, que atua por detrás de cada ser e que subjaz a todos os eventos históricos e que permite emergências surpreendentes. É do caos que nasce a nova ordem. Devemos fazer de tudo para que o atual caos não seja destrutivo mas criativo. Então sobrevivemos com o mesmo destino da Terra, a única casa comum que temos para morar.

Hobsbawm na Carta Maior


Em entrevista a Marcello Musto, o historiador Eric Hobsbawm analisa a atualidade da obra de Marx e o renovado interesse que vem despertando nos últimos anos, mais ainda agora após a nova crise de Wall Street. E fala sobre a necessidade de voltar a ler o pensador alemão: “Marx não regressará como uma inspiração política para a esquerda até que se compreenda que seus escritos não devem ser tratados como programas políticos, mas sim como um caminho para entender a natureza do desenvolvimento capitalista”.

Eric Hobsbawm é considerado um dos maiores historiadores vivos. É presidente do Birbeck College (London University) e professor emérito da New School for Social Research (Nova Iorque). Entre suas muitas obras, encontra-se a trilogia acerca do “longo século XIX”: “A Era da Revolução: Europa 1789-1848” (1962); “A Era do Capital: 1848-1874” (1975); “A Era do Império: 1875-1914 (1987) e o livro “A Era dos Extremos: o breve século XX, 1914-1991 (1994), todos traduzidos em vários idiomas.

Entrevistamos o historiador por ocasião da publicação do livro “Karl Marx’s Grundrisse. Foundations of the Critique of Political Economy 150 Years Later” (Os Manuscritos de Karl Marx. Elementos fundamentais para a Crítica da Economia Política, 150 anos depois).

Nesta conversa, abordamos o renovado interesse que os escritos de Marx vêm despertando nos últimos anos e mais ainda agora após a nova crise de Wall Street. Nosso colaborador Marcello Musto entrevistou Hobsbawm para Sin Permiso.

Marcello Musto: Professor Hobsbawm, duas décadas depois de 1989, quando foi apressadamente relegado ao esquecimento, Karl Marx regressou ao centro das atenções. Livre do papel de intrumentum regni que lhe foi atribuído na União Soviética e das ataduras do “marxismo-leninismo” , não só tem recebido atenção intelectual pela nova publicação de sua obra, como também tem sido objeto de crescente interesse. Em 2003, a revista francesa Nouvel Observateur dedicou um número especial a Marx, com um título provocador: “O pensador do terceiro milênio?”. Um ano depois, na Alemanha, em uma pesquisa organizada pela companhia de televisão ZDF para estabelecer quem eram os alemães mais importantes de todos os tempos, mais de 500 mil espectadores votaram em Karl Marx, que obteve o terceiro lugar na classificação geral e o primeiro na categoria de “relevância atual”.

Em 2005, o semanário alemão Der Spiegel publicou uma matéria especial que tinha como título “Ein Gespenst Kehrt zurük” (A volta de um espectro), enquanto os ouvintes do programa “In Our Time” da rádio 4, da BBC, votavam em Marx como o maior filósofo de todos os tempos. Em uma conversa com Jacques Attali, recentemente publicada, você disse que, paradoxalmente, “são os capitalistas, mais que outros, que estão redescobrindo Marx” e falou também de seu assombro ao ouvir da boca do homem de negócios e político liberal, George Soros, a seguinte frase: “Ando lendo Marx e há muitas coisas interessantes no que ele diz”. Ainda que seja débil e mesmo vago, quais são as razões para esse renascimento de Marx? É possível que sua obra seja considerada como de interesse só de especialistas e intelectuais, para ser apresentada em cursos universitários como um grande clássico do pensamento moderno que não deveria ser esquecido? Ou poderá surgir no futuro uma nova “demanda de Marx”, do ponto de vista político?

Eric Hobsbawm: Há um indiscutível renascimento do interesse público por Marx no mundo capitalista, com exceção, provavelmente, dos novos membros da União Européia, do leste europeu. Este renascimento foi provavelmente acelerado pelo fato de que o 150° aniversário da publicação do Manifesto Comunista coincidiu com uma crise econômica internacional particularmente dramática em um período de uma ultra-rápida globalização do livre-mercado.

Marx previu a natureza da economia mundial no início do século XXI, com base na análise da “sociedade burguesa”, cento e cinqüenta anos antes. Não é surpreendente que os capitalistas inteligentes, especialmente no setor financeiro globalizado, fiquem impressionados com Marx, já que eles são necessariamente mais conscientes que outros sobre a natureza e as instabilidades da economia capitalista na qual eles operam.

A maioria da esquerda intelectual já não sabe o que fazer com Marx. Ela foi desmoralizada pelo colapso do projeto social-democrata na maioria dos estados do Atlântico Norte, nos anos 1980, e pela conversão massiva dos governos nacionais à ideologia do livre mercado, assim como pelo colapso dos sistemas políticos e econômicos que afirmavam ser inspirados por Marx e Lênin. Os assim chamados “novos movimentos sociais”, como o feminismo, tampouco tiveram uma conexão lógica com o anti-capitalismpo (ainda que, individualmente, muitos de seus membros possam estar alinhados com ele) ou questionaram a crença no progresso sem fim do controle humano sobre a natureza que tanto o capitalismo como o socialismo tradicional compartilharam. Ao mesmo tempo, o “proletariado” , dividido e diminuído, deixou de ser crível como agente histórico da transformação social preconizada por Marx.

Devemos levar em conta também que, desde 1968, os mais proeminentes movimentos radicais preferiram a ação direta não necessariamente baseada em muitas leituras e análises teóricas. Claro, isso não significa que Marx tenha deixado de ser considerado como um grande clássico e pensador, ainda que, por razões políticas, especialmente em países como França e Itália, que já tiveram poderosos Partidos Comunistas, tenha havido uma apaixonada ofensiva intelectual contra Marx e as análises marxistas, que provavelmente atingiu seu ápice nos anos oitenta e noventa. Há sinais agora de que a água retomará seu nível.

Marcello Musto: Ao longo de sua vida, Marx foi um agudo e incansável investigador, que percebeu e analisou melhor do que ninguém em seu tempo o desenvolvimento do capitalismo em escala mundial. Ele entendeu que o nascimento de uma economia internacional globalizada era inerente ao modo capitalista de produção e previu que este processo geraria não somente o crescimento e prosperidade alardeados por políticos e teóricos liberais, mas também violentos conflitos, crises econômicas e injustiça social generalizada. Na última década, vimos a crise financeira do leste asiático, que começou no verão de 1997; a crise econômica Argentina de 1999-2002 e, sobretudo, a crise dos empréstimos hipotecários que começou nos Estados Unidos em 2006 e agora tornou-se a maior crise financeira do pós-guerra. É correto dizer, então, que o retorno do interesse pela obra de Marx está baseado na crise da sociedade capitalista e na capacidade dele ajudar a explicar as profundas contradições do mundo atual?

Eric Hobsbawm: Se a política da esquerda no futuro será inspirada uma vez mais nas análises de Marx, como ocorreu com os velhos movimentos socialistas e comunistas, isso dependerá do que vai acontecer no mundo capitalista. Isso se aplica não somente a Marx, mas à esquerda considerada como um projeto e uma ideologia política coerente. Posto que, como você diz corretamente, a recuperação do interesse por Marx está consideravelmente – eu diria, principalmente – baseado na atual crise da sociedade capitalista, a perspectiva é mais promissora do que foi nos anos noventa. A atual crise financeira mundial, que pode transformar- se em uma grande depressão econômica nos EUA, dramatiza o fracasso da teologia do livre mercado global descontrolado e obriga, inclusive o governo norte-americano, a escolher ações públicas esquecidas desde os anos trinta.

As pressões políticas já estão debilitando o compromisso dos governos neoliberais em torno de uma globalização descontrolada, ilimitada e desregulada. Em alguns casos, como a China, as vastas desigualdades e injustiças causadas por uma transição geral a uma economia de livre mercado, já coloca problemas importantes para a estabilidade social e mesmo dúvidas nos altos escalões de governo. É claro que qualquer “retorno a Marx” será essencialmente um retorno à análise de Marx sobre o capitalismo e seu lugar na evolução histórica da humanidade – incluindo, sobretudo, suas análises sobre a instabilidade central do desenvolvimento capitalista que procede por meio de crises econômicas auto-geradas com dimensões políticas e sociais. Nenhum marxista poderia acreditar que, como argumentaram os ideólogos neoliberais em 1989, o capitalismo liberal havia triunfado para sempre, que a história tinha chegado ao fim ou que qualquer sistema de relações humanas possa ser definitivo para todo o sempre.

Marcello Musto: Você não acha que, se as forças políticas e intelectuais da esquerda internacional, que se questionam sobre o que poderia ser o socialismo do século XXI, renunciarem às idéias de Marx, estarão perdendo um guia fundamental para o exame e a transformação da realidade atual?

Eric Hobsbawm: Nenhum socialista pode renunciar às idéias de Marx, na medida que sua crença em que o capitalismo deve ser sucedido por outra forma de sociedade está baseada, não na esperança ou na vontade, mas sim em uma análise séria do desenvolvimento histórico, particularmente da era capitalista. Sua previsão de que o capitalismo seria substituído por um sistema administrado ou planejado socialmente parece razoável, ainda que certamente ele tenha subestimado os elementos de mercado que sobreviveriam em algum sistema pós-capitalista.

Considerando que Marx, deliberadamente, absteve-se de especular acerca do futuro, não pode ser responsabilizado pelas formas específicas em que as economias “socialistas” foram organizadas sob o chamado “socialismo realmente existente”. Quanto aos objetivos do socialismo, Marx não foi o único pensador que queria uma sociedade sem exploração e alienação, em que os seres humanos pudessem realizar plenamente suas potencialidades, mas foi o que expressou essa idéia com maior força e suas palavras mantêm seu poder de inspiração.

No entanto, Marx não regressará como uma inspiração política para a esquerda até que se compreenda que seus escritos não devem ser tratados como programas políticos, autoritariamente ou de outra maneira, nem como descrições de uma situação real do mundo capitalista de hoje, mas sim como um caminho para entender a natureza do desenvolvimento capitalista. Tampouco podemos ou devemos esquecer que ele não conseguiu realizar uma apresentação bem planejada, coerente e completa de suas idéias, apesar das tentativas de Engels e outros de construir, a partir dos manuscritos de Marx, um volume II e III de “O Capital”. Como mostram os “Grundrisse”, aliás. Inclusive, um Capital completo teria conformado apenas uma parte do próprio plano original de Marx, talvez excessivamente ambicioso.

Por outro lado, Marx não regressará à esquerda até que a tendência atual entre os ativistas radicais de converter o anti-capitalismo em anti-globalizaçã o seja abandonada. A globalização existe e, salvo um colapso da sociedade humana, é irreversível. Marx reconheceu isso como um fato e, como um internacionalista, deu as boas vindas, teoricamente. O que ele criticou e o que nós devemos criticar é o tipo de globalização produzida pelo capitalismo.

Marcello Musto: Um dos escritos de Marx que suscitaram o maior interesse entre os novos leitores e comentadores são os “Grundrisse”. Escritos entre 1857 e 1858, os “Grundrisse” são o primeiro rascunho da crítica da economia política de Marx e, portanto, também o trabalho inicial preparatório do Capital, contendo numerosas reflexões sobre temas que Marx não desenvolveu em nenhuma outra parte de sua criação inacabada. Por que, em sua opinião, estes manuscritos da obra de Marx, continuam provocando mais debate que qualquer outro texto, apesar do fato dele tê-los escrito somente para resumir os fundamentos de sua crítica da economia política? Qual é a razão de seu persistente interesse?

Eric Hobsbawm: Desde o meu ponto de vista, os "Grundrisse" provocaram um impacto internacional tão grande na cena marxista intelectual por duas razões relacionadas. Eles permaneceram virtualmente não publicados antes dos anos cinqüenta e, como você diz, contendo uma massa de reflexões sobre assuntos que Marx não desenvolveu em nenhuma outra parte. Não fizeram parte do largamente dogmatizado corpus do marxismo ortodoxo no mundo do socialismo soviético. Mas não podiam simplesmente ser descartados. Puderam, portanto, ser usados por marxistas que queriam criticar ortodoxamente ou ampliar o alcance da análise marxista mediante o apelo a um texto que não podia ser acusado de herético ou anti-marxista. Assim, as edições dos anos setenta e oitenta, antes da queda do Muro de Berlim, seguiram provocando debate, fundamentalmente porque nestes escritos Marx coloca problemas importantes que não foram considerados no “Capital”, como por exemplo as questões assinaladas em meu prefácio ao volume de ensaios que você organizou (Karl Marx's Grundrisse. Foundations of the Critique of Political Economy 150 Years Later, editado por M. Musto, Londres-Nueva York, Routledge, 2008).

Marcello Musto: No prefácio deste livro, escrito por vários especialistas internacionais para comemorar o 150° aniversário de sua composição, você escreveu: “Talvez este seja o momento correto para retornar ao estudo dos “Grundrisse”, menos constrangidos pelas considerações temporais das políticas de esquerda entre a denúncia de Stalin, feita por Nikita Khruschev, e a queda de Mikhail Gorbachev”. Além disso, para destacar o enorme valor deste texto, você diz que os “Grundrisse” “trazem análise e compreensão, por exemplo, da tecnologia, o que leva o tratamento de Marx do capitalismo para além do século XIX, para a era de uma sociedade onde a produção não requer já mão-de-obra massiva, para a era da automatização, do potencial de tempo livre e das transformações do fenômeno da alienação sob tais circunstâncias. Este é o único texto que vai, de alguma maneira, mais além dos próprios indícios do futuro comunista apontados por Marx na “Ideologia Alemã”. Em poucas palavras, esse texto tem sido descrito corretamente como o pensamento de Marx em toda sua riqueza. Assim, qual poderia ser o resultado da releitura dos “Grundrisse” hoje?

Eric Hobsbawm: Não há, provavelmente, mais do que um punhado de editores e tradutores que tenham tido um pleno conhecimento desta grande e notoriamente difícil massa de textos. Mas uma releitura ou leitura deles hoje pode ajudar-nos a repensar Marx: a distinguir o geral na análise do capitalismo de Marx daquilo que foi específico da situação da sociedade burguesa na metade do século XIX. Não podemos prever que conclusões podem surgir desta análise. Provavelmente, somente podemos dizer que certamente não levarão a acordos unânimes.

Marcello Musto: Para terminar, uma pergunta final. Por que é importante ler Marx hoje?

Eric Hobsbawm: Para qualquer interessado nas idéias, seja um estudante universitário ou não, é patentemente claro que Marx é e permanecerá sendo uma das grandes mentes filosóficas, um dos grandes analistas econômicos do século XIX e, em sua máxima expressão, um mestre de uma prosa apaixonada. Também é importante ler Marx porque o mundo no qual vivemos hoje não pode ser entendido sem levar em conta a influência que os escritos deste homem tiveram sobre o século XX. E, finalmente, deveria ser lido porque, como ele mesmo escreveu, o mundo não pode ser transformado de maneira efetiva se não for entendido. Marx permanece sendo um soberbo pensador para a compreensão do mundo e dos problemas que devemos enfrentar.

Tradução para Sin Permiso (inglês-espanhol) : Gabriel Vargas Lozano
Tradução para Carta Maior (espanhol-portuguê s): Marco Aurélio Weissheimer

Fonte: Boletim Carta Maior

Chesnais

Nesta apresentação feita em 18 de Setembro de 2008 em Buenos Aires, o economista marxista francês François Chesnais expõe a forma como o capitalismo, na sua longa fase de expansão, tentou superar os seus limites imanentes. E como todas essas tentativas contribuíram para criar agora uma crise muito maior. Comparável à de 1929, mas que ocorre num contexto totalmente novo.

A tese que vou apresentar defende que no ano passado produziu-se uma verdadeira ruptura, que deixa para trás uma longa fase de expansão da economia capitalista mundial; e que essa ruptura marca o início de um processo de crise com características que são comparáveis à crise de 1929, ainda que venha a desenvolver- se num contexto muito diferente.

A primeira coisa que é preciso recordar é que a crise de 1929 se desenvolveu como um processo: um processo que começou em 1929, mas cujo ponto culminante se deu bastante depois, em 1933, e que logo abriu caminho a uma longa fase de recessão. Digo isto para sublinhar que, na minha opinião, estamos a viver as primeiras etapas, mas realmente as primeiras, primeiríssimas etapas de um processo dessa amplitude e dessa temporalidade. E que o que nestes dias está acontecendo e tem como cenário os mercados financeiros de Nova York, de Londres e de outros grandes centros bolsistas, é somente um aspecto - e talvez não seja o aspecto mais importante - do que se deve interpretar como um processo histórico.

Estamos diante de um desses momentos em que a crise vem exprimir os limites históricos do sistema capitalista. Não se trata de alguma versão da teoria da "crise final" do capitalismo, ou algo do estilo. Do que sim se trata, na minha opinião, é de entender que estamos confrontados com uma situação em que se exprimem estes limites históricos da produção capitalista. Não quero parecer um pastor com a sua Bíblia marxista, mas quero ler-vos uma passagem de O Capital:

"O verdadeiro limite da produção capitalista é o próprio capital; é o fato de que, nela, são o capital e a sua própria valorização que constituem o ponto de partida e a meta, o motivo e o fim da produção; o fato de que aqui a produção é só produção para o capital e, inversamente, não são os meios de produção simples meios para ampliar cada vez mais a estrutura do processo de vida da sociedade dos produtores. Daí que os limites dentro dos quais tem de mover-se a conservação e a valorização do valor-capital, a qual descansa na expropriação e na depauperção das grandes massas de produtores, choquem constantemente com os métodos de produção que o capital se vê obrigado a empregar para conseguir os seus fins e que tendem para o aumento ilimitado da produção, para a produção pela própria produção, para o desenvolvimento incondicional das forças produtivas do trabalho. O meio empregado - desenvolvimento incondicional das forças sociais produtivas - choca constantemente com o fim perseguido, que é um fim limitado: a valorização do capital existente. Por conseguinte, se o regime capitalista de produção constitui um meio histórico para desenvolver a capacidade produtiva material e criar o mercado mundial correspondente, envolve ao mesmo tempo uma contradição constante entre esta missão histórica e as condições sociais de produção próprias deste regime. (1)

Bom, certamente que há algumas palavras que hoje já não utilizamos, como "missão histórica"... Mas creio que o que vamos ver nos próximos anos vai dar-se precisamente na base de já ter sido criado em toda a sua plenitude esse mercado mundial intuído por Marx. Quer dizer, temos um mercado e uma situação mundial diferentes da de 1929, porque nessa altura países como a China e a Índia eram ainda semi-coloniais, enquanto que agora já não têm esse caráter; são grandes países que, mais além de terem um caráter combinado que requer uma análise cuidadosa, são agora participantes de pleno direito dentro de uma economia mundial única, uma economia mundial unificada num grau desconhecido até esta etapa da história. A citação pode ajudar-nos a entender o momento atual, e a crise que se iniciou precisamente neste marco de um só mundo.

Um novo tipo de crise
Na minha opinião, nesta nova etapa, a crise vai desenvolver- se de tal modo que as primeiras e realmente brutais manifestações da crise climática mundial vão combinar-se com a crise do capital enquanto tal. Entramos numa fase em que se coloca realmente uma crise da humanidade, dentro de complexas relações nas quais se incluem também os acontecimentos bélicos, mas o mais importante é que, mesmo excluindo a explosão de uma guerra de grande amplitude que, no presente momento, só podia ser uma guerra atómica, estamos confrontados com um novo tipo de crise, com uma combinação desta crise econômica, que começou, com uma situação na qual a natureza, tratada sem a menor contemplação e atacada pelo homem no marco do capitalismo, reage agora de forma brutal. Isto é uma coisa quase excluída das nossas discussões, mas que vai impor-se como um fato central.

Por exemplo, muito recentemente, lendo o trabalho de um sociólogo francês, fiquei a saber que os glaciares andinos dos quais flui a água com que se abastecem La Paz e El Alto estão esgotados em mais de 80%, e estima-se que dentro de 15 anos La Paz e El Alto não vão ter água... e, no entanto, isto é algo que nunca foi tratado, nunca se discutiu um fato de tamanha magnitude que pode fazer com que a luta de classes na Bolívia, tal como a conhecemos, mude substancialmente - por exemplo fazendo com que a tal controversa mudança da capital para Sucre se imponha como uma coisa "natural", porque acabou a água em La Paz.

Estamos entrando num período desse tipo e o problema é que quase não se fala disso, enquanto que nos ambientes revolucionários continuam a discutir-se coisas que neste momento são minúcias, questões completamente mesquinhas em comparação com os desafios que temos pela frente.

Limites imanentes do capitalismo
Para continuar com a questão dos limites do capitalismo, quero chamar a atenção para uma citação de Marx, imediatamente anterior à já citada: "A produção capitalista aspira constantemente a superar estes limites imanentes a ela, mas só pode superá-los recorrendo a meios que voltam a levantar diante dela estes mesmo limites, e ainda com mais força". (2) Esta indicação introduz-nos a análise e a discussão dos meios a que se recorreu, durante os últimos 30 anos, para superar os limites imanentes do capital.

Esses meios foram, em primeiro lugar, todo o processo de liberalização das finanças, do comércio e do investimento, todo o processo de destruição das relações políticas surgidas na raíz da crise de 29 e dos anos 30, depois da Segunda Guerra Mundial e das guerras de libertação nacional... Todas essas relações, que exprimiam o domínio do capital mas representavam ao mesmo tempo formas de controle parcial do mesmo capital, foram destroçadas e, por algum tempo, pareceu ao capital que com isto ficavam superados os limites postos à sua atuação.

A segunda forma que se escolheu para superar esses limites imanentes do capital foi recorrer, numa escala sem precedentes, à criação de capital fictício e de meios de crédito para ampliar uma procura insuficiente no centro do sistema.

E a terceira forma, a mais importante historicamente para o capital, foi a reincorporação, enquanto elementos plenos do sistema capitalista mundial, da União Soviética e seus "satélites", e da China.

Só no marco das resultantes destes três processos é possível captar a amplitude e a novidade da crise que se inicia.

Liberalização, mercado mundial, competição... Comecemos por nos interrogar sobre o que significou a liberalização e a desregulação levadas a cabo à escala mundial, com a incorporação do antigo "campo" soviético e a incorporação e a modificação das relações de produção na China... O processo de liberalização e desregulação significou o desmantelamento dos poucos elementos reguladores que se tinham construído no marco internacional ao sair da Segunda Guerra Mundial, para entrar num capitalismo totalmente desregulamentado. E não só desregulamentado, como também um capitalismo que criou realmente o mercado mundial no pleno sentido do termo, convertendo em realidade o que era em Marx uma intuição ou antecipação. Pode ser útil precisar o conceito de mercado mundial e ir talvez mais além da palavra mercado.

Trata-se da criação de um espaço livre de restrições para as operações do capital, para produzir e realizar mais-valias, tomando este espaço como base e processo de centralização de lucros à escala verdadeiramente internacional. Esse espaço aberto, não homogêneo mas com uma redução drástica de todos os obstáculos à mobilidade do capital, essa possibilidade para o capital de organizar à escala universal o ciclo de valorização, está acompanhado de uma situação que permite pôr em competição entre si os trabalhadores de todos os países. Quer dizer, sustenta-se no fato de o exército industrial de reserva ser realmente mundial e de ser o capital como um todo que rege os fluxos de integração ou de repulsão, nas formas estudadas por Marx.

Este é então o marco geral de um processo de "produção para a produção" em condições em que a possibilidade de a humanidade e as massas do mundo acederem a essa produção é totalmente limitada... e, portanto, torna-se cada vez mais difícil o encerramento com êxito do ciclo de valorização do capital, para o capital no seu conjunto, e para cada capital em particular. E por isso se ampliam e se fazem mais determinantes no mercado mundial "as leis cegas da competição".. Os bancos centrais e os governos podem proclamar que vão pôr-se de acordo entre si e colaborar para impedir a crise, mas não creio que se possa introduzir a cooperação no espaço mundial convertido em cenário de uma tremenda competição entre capitais.

E agora, a competição entre capitais vai muito mais além das relações entre os capitais das partes mais antigas e mais desenvolvidas do sistema mundial, com os sectores menos desenvolvidos do ponto de vista capitalista. Porque sob formas particulares e inclusive muito parasitárias, no marco mundial deram-se processos de centralização do capital por fora do marco tradicional dos centros imperialistas: em relação com eles, mas em condições que também introduzem algo totalmente novo no marco mundial.

Durante os últimos 15 anos, e em particular durante a última etapa, desenvolveram- se, em determinados pontos do sistema, grupos industriais capazes de integrar-se como sócios de pleno direito nos oligopólios mundiais. Tanto na Índia como na China constituíram- se verdadeiros e fortes grupos econômicos capitalistas. E, no plano financeiro, como expressão do rentismo e do parasitismo puro, os chamados Fundos Soberanos converteram- se em importantes pontos de centralização do capital sob a forma de dinheiro, que não são meros satélites dos Estados Unidos, têm estratégias e dinâmicas próprias e modificam de muitas maneiras as relações geopolíticas dos pontos-chave em que a vida do capital se faz e fará.

Por isso, outro elemento a ter em conta é que esta crise tem como outra de suas dimensões a de marcar o fim da etapa em que os Estados Unidos podiam atuar como potência mundial sem comparação... Na minha opinião, saímos do momento que analisava Mészáros no seu livro de 2001, e os Estados Unidos vão ser submetidos a uma prova: num prazo muito curto, todas as suas relações mundiais modificaram- se e terão, no melhor dos casos, de renegociar e reordenar todas as suas relações com base no facto de que têm de partilhar o poder.. E isto, evidentemente, é algo que nunca aconteceu de forma pacífica na história do capital...

Então, primeiro elemento: um dos métodos escolhidos pelo capital para superar os seus limites transformou- se em fonte de novas tensões, conflitos e contradições, indicando que uma nova etapa histórica vai abrir caminho através desta crise.

Criação descontrolada de capital fictício
O segundo meio utilizado para superar os limites do capital das economias centrais foi que todas elas recorreram à criação de formas totalmente artificiais de ampliação da procura efectiva, as quais, somando-se a outras formas de criação de capital fictício, geraram as condições para a crise financeira que se desenvolve hoje. No artigo que os companheiros de Herramienta tiveram a gentileza de traduzir para o espanhol e publicar, abordei com alguma profundidade esta questão do capital fictício e as novas formas que se deram dentro do próprio processo de acumulação do capital fictício.

Para Marx, o capital fictício é a acumulação de títulos que são "sombra de investimentos" já feitos mas que, como títulos de bônus e de ações, aparecem com o aspecto de capital aos seus detentores. Não o são para o sistema como um todo, para o processo de acumulação, mas são-no sim para os seus detentores e, em condições normais de fechamento de processos de valorização do capital, rendem aos seus detentores dividendos e juros. Mas o seu caráter fictício revela-se em situações de crise. Quando ocorrem crises de sobreprodução, falência de empresas, etc., descobre-se que esse capital não existia...

Por isso também pode ler-se às vezes nos jornais que tal ou qual quantidade de capital "desapareceu" nalgum tropeço bolsista: essas quantias nunca tinham existido como capital propriamente dito, apesar de, para os detentores dessas ações, representarem títulos que davam direito a dividendos e juros, a receber lucros...

Evidentemente, um dos grandes problemas de hoje é que, em muitíssimos países, os sistemas de aposentadoria estão baseados em capital fictício, com pretensões de participação nos resultados de uma produção capitalista que pode desaparecer em momentos de crise. Toda a etapa de liberalização e de globalização financeira dos anos 80 e 90 esteve baseada em acumulação de capital fictício, sobretudo em mãos de fundos de investimento, fundos de pensões, fundos financeiros. .. E a grande novidade desde finais ou meados dos anos 90 e ao largo dos anos 2000 foi, nos Estados Unidos e na Grã-Bretanha em particular, o impulso extraordinário que se deu à criação de capital fictício na forma de crédito.

De crédito a empresas, mas também e sobretudo de créditos às famílias, crédito ao consumo e sobretudo créditos hipotecários. E isso fez dar um salto na massa de capital fictício criado, dando origem a formas ainda mais agudas de vulnerabilidade e de fragilidade, inclusive diante de choques menores, inclusive diante de episódios absolutamente previsíveis. Por exemplo, com base em tudo estudado anteriormente, sabia-se que um boom imobiliário acaba; que inexoravelmente chega um momento em que, por processos muito bem estudados, termina; e, se pode até ser relativamente compreensível que no mercado de ações existisse a ilusão de que não havia limites para a alta no preço das acções, com base em toda a história anterior sabia-se que que isso não podia ocorrer no setor imobiliário: quando se trata de edifícios e de casas é inevitável que chegue o momento em que o boom acaba.

Mas colocaram-se em tal situação de dependência, que esse acontecimento completamente normal e previsível transformou- se numa crise tremenda.. Porque a tudo o que já disse, juntou-se o fato de que durante os dois últimos anos os empréstimos eram feitos a famílias que não tinham a menor possibilidade de pagar. Além disso, tudo isso se combinou com as novas "técnicas" financeiras, permitindo-se assim que os bancos vendessem bônus em condições tais que ninguém podia saber exatamente o que estava a comprar... até a explosão dos subprime em 2007.

Agora estão desmontando este processo. Mas dentro dessa desmontagem, há processos de concentração do capital financeiro. Quando o Bank Of America compra o Merrill Lynch, estamos diante de um processo de concentração clássico. E vemos além disso estes processos de estatização das dívidas, que implicam na criação imediata de mais capital fictício. O Federal Reserve dos Estados Unidos cria mais capital fictício para manter a ilusão de um valor do capital que está à beira de desmoronar, com a perspectiva de ter, em algum momento dado, a possibilidade de aumentar fortemente a pressão fiscal, mas na realidade não pode fazê-lo porque isso significaria o congelamento do mercado interno e a aceleração da crise enquanto crise real.

Assistimos, pois, a uma fuga em frente que não resolve nada. Dentro desse processo existe também o avanço dos Fundos Soberanos, que procuram modificar a repartição intercapitalista dos fluxos financeiros a favor dos sectores rentistas que acumularam estes fundos. E isto é um fator de perturbação ainda maior no processo.

Quero recordar, para terminar este ponto, que esse déficit comercial de cinco pontos do PIB é o que confere aos Estados Unidos a particularidade desse lugar-chave para a concretização do ciclo do capital no momento da realização da mais-valia, para o processo capitalista no seu conjunto.

Confrontados agora com uma quase inevitável retração econômica, coloca-se como a grande interrogação se, num curto prazo, a procura interna chinesa poderá passar a ser o lugar que garanta esse momento de realização da mais-valia que se dava nos Estados Unidos. A amplitude da intervenção do Tesouro é muito forte e conseguiu que a contração da atividade nos EUA e a queda das importações tenha sido até agora muito limitada. O problema é saber quanto tempo se poderá ter como único método de política econômica criar mais e mais liquidez... Será possível que não haja limites à criação de capital fictício sob a forma de liquidez para manter o valor do capital fictício já existente? Parece-me uma hipótese demasiado otimista, e entre os próprios economistas norte-americanos, muitos duvidam.

Super-acumulaçã o na China?
Para terminar, chegamos à terceira maneira pela qual o capital superou os seus limites imanentes, que é definitivamente a mais importante de todas e levanta as interrogações mais interessantes. Refiro-me à extensão, em particular para a China, de todo o sistema de relações sociais de produção do capitalismo. Algo que Marx mencionou nalgum momento como possibilidade, mas que só se fez realidade durante os últimos anos. E realizou-se em condições que multiplicam os fatores de crise.

A acumulação do capital na China fez-se com base em processos internos, mas também com base em algo que está perfeitamente documentado, mas pouco comentado: a transferência de uma parte importantíssima do Setor II da economia, o setor da produção de meios de consumo, dos Estados Unidos para a China. E isto tem muito a ver com o grosso dos déficits norte-americanos (o déficit comercial e o fiscal), que só poderiam reverter-se por meio de uma "reindustrializaçã o" dos Estados Unidos.

Isto significa que se estabeleceram novas relações entre os Estados Unidos e a China. Já não são as relações de uma potência imperialista com um espaço semicolonial. Os Estados Unidos criaram relações de um novo tipo, que agora têm dificuldades de reconhecer e de assumir. Com base no superávit comercial, a China acumula milhões e milhões de dólares, que logo empresta aos Estados Unidos. Temos uma ilustração das consequências que isto traz com a nacionalização dessas duas entidades chamadas Fannie Mae e Freddy Mac: ao que parece, a banca da China tinha 15% dos fundos dessas duas entidades e comunicou ao governo americano que não aceitaria a sua desvalorização. São relações internacionais de tipo completamente novo.

Mas que ocorre no seio da própria China? É a questão mais decisiva para a próxima etapa da crise. Na China deu-se internamente um processo de competição entre capitais, que se combinou com processos de competição entre sectores do aparelho político chinês, e de competição para atrair empresas estrangeiras; tudo isso resultou num processo de criação de imensas capacidades de produção, além de violentar a natureza numa escala enorme: na China concentra-se uma super-acumulaçã o de capital que num momento dado se tornará insustentável.

Na Europa, é evidente a tendência a uma aceleração da destruição de capacidades produtivas e de postos de trabalho, para transferir-se para o único paraíso do mundo capitalista que é a China. Considero que esta transferência de capitais para a China significou uma reversão de processos anteriores de uma alta da composição orgânica do capital. A acumulação é intensiva em meios de produção e é intensiva e muito delapidadora da outra parte do capital constante, quer dizer, das matérias primas. A maciça criação de capacidades de produção no Setor I foi acompanhada por todos os mecanismos e o impulso que caracterizam o crescimento da China, mas o mercado final para sustentar toda essa produção é o mercado mundial, e uma retração deste colocará em evidência essa super-acumulaçã o do capital.

Alguém como Aglietta, que estudou isto especificamente, afirma que realmente há super-acumulaçã o, há um processo acelerado de criação produtiva na China, um processo que, no momento em que terminar - e tem de terminar - a realização de toda essa produção vai levantar problemas. Além disso, a China é realmente um lugar decisivo, porque até pequenas variações na sua economia determinam a conjuntura de muitos outros países no mundo. Foi suficiente que a procura chinesa por bens de investimento caísse um pouco, para que a Alemanha perdesse exportações e entrasse em recessão. As "pequenas oscilações" na China têm repercussões fortíssimas noutros lugares, como deveria ser evidente no caso da Argentina.

Para continuar a pensar e a discutir
E regresso ao que disse no início. Ainda que sejam comparáveis, as fases desta crise serão diferentes das de 29, porque naquela época a crise de superprodução dos Estados Unidos verificou-se desde os primeiros momentos. Depois aprofundou-se, mas soube-se de imediato que se estava diante de uma crise de superpodução. Agora, em contrapartida, estão adiando esse momento com diversas políticas, mas não vão poder fazê-lo muito mais.

Simultaneamente, e como ocorreu também na crise de 29 e nos anos 30, ainda que em condições e sob formas diferentes, a crise combinar-se-á com a necessidade, para o capitalismo, de uma reorganização total da expressão das suas relações de forças econômicas no marco mundial, marcando o momento no qual os Estados Unidos verão que a sua superioridade militar é somente um elemento, e um elemento bastante subordinado, para renegociar as suas relações com a China e outras partes do mundo. Ou vai chegar o momento no qual dará o salto para uma aventura militar de consequência imprevisíveis.

Por tudo isto, concluo que vivemos muito mais que uma crise financeira, mesmo estando agora nessa fase. Estamos diante de uma crise muitíssimo mais ampla. Ora bem, tenho a impressão, pelo tom das diferentes perguntas e observações que me fizeram, que muitos são da opinião que estou a pintar um cenário de tipo catastrofista, de desmoronamento do capitalismo. .. Na realidade, creio que estamos diante do risco de uma catástrofe, mas já não do capitalismo, e sim de uma catástrofe da humanidade. De certa forma, se tomarmos em conta a crise climática, possivelmente já existe algo assim...

A minha opinião (junto com Mészáros, por exemplo, mas somos muito poucos os que damos importância a isto) é que estamos diante de um perigo iminente. O dramático é que, de momento, isto afeta diretamente populações que não são levadas em conta: o que está ocorrendo no Haiti parece que não tem a menor importância histórica; o que acontece em Bangladesh não tem peso mais além da região afetada; muito menos o que acontece na Birmânia, porque o controle da Junta militar impede que ultrapasse as suas fronteiras. E o mesmo na China: discutem-se os índices de crescimento, mas não as catástrofes ambientais, porque o aparelho repressivo controla as informações sobre as mesmas.

E o pior é que essa "opinião", que é constantemente construída pelos meios de comunicação, está interiorizada muito profundamente, inclusive em muitos intelectuais de esquerda. Tinha começado a trabalhar e a escrever sobre tudo isto, mas com o começo desta crise, de alguma forma tive de voltar a ocupar-me das finanças, ainda que não o faça com muito gosto, porque o essencial parece-me que se joga num plano diferente.

Para terminar: o fato de que tudo isto ocorre depois desta fase tão larga, sem paralelo na história do capitalismo, de 50 anos de acumulação ininterrupta (salvo um pequeníssima ruptura em 1974/1975), assim como também tudo o que os círculos capitalistas dirigentes, e em particular os bancos centrais, aprenderam da crise de 29, tudo isso faz com que a crise avance de maneira bastante lenta.

Desde setembro do ano passado, o discurso dos círculos dominantes vem afirmando, uma e outra vez, que "o pior já passou", quando o certo é que, uma e outra vez, "o pior" estava por vir. Mas insisto no risco de minimizar a gravidade da situação, e sugiro que nas nossas análises e na forma de abordar as coisas deveríamos incorporar a possibilidade, no mínimo a possibilidade, de que inadvertidamente estejamos também interiorizando esse discurso de que, definitivamente, "não acontece nada"...

* François Chesnais é economista, faz parte do Conselho Científico do ATTAC-França, é diretor de Carré Rouge e membro do conselho consultivo da revista Herramienta, com a qual colabora assiduamente.


Esta apresentação foi realizada no encontro organizado pela revista argentina "Herramienta" em 18 de Setembro de 2008. A transcrição e preparação para a sua publicação é de Aldo Casas.

Versão publicada no portal Esquerda.Net. Tradução para o português: Luis Leiria (Esquerda.Net)

(1) Karl Marx, El capital México, FCE, 1973, Vol. III, pág. 248.

(2) Idem.

(3) "El fin de un ciclo. Alcance y rumbo de la crisis financiera", en Herramienta Nº 37, marzo 2008

Fonte: http://www.cartamai or.com.br/ templates/ materiaMostrar. cfm?materia_ id=15284

Nota pública sobre o assassinato de Elton Brum pela Brigada Militar do RS - 21/08/2009


O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra vem a público manifestar novamente seu pesar pela perda do companheiro Elton Brum, manifestar sua solidariedade à família e para:

1. Denunciar mais uma ação truculenta e violenta da Brigada Militar do Rio Grande do Sul que resultou no assassinato do agricultor Elton Brum, 44 anos, pai de dois filhos, natural de Canguçu, durante o despejo da ocupação da Fazenda Southall em São Gabriel. As informações sobre o despejo apontam que Brum foi assassinado quando a situação já encontrava-se controlada e sem resistência. Há indícios de que tenha sido assassinado pelas costas.

2. Denunciar que além da morte do trabalhador sem terra, a ação resultou ainda em dezenas de feridos, incluindo mulheres e crianças, com ferimentos de estilhaços, espadas e mordidas de cães.

3. Denunciamos a Governadora Yeda Crusius, hierarquicamente comandante da Brigada Militar, responsável por uma política de criminalização dos movimentos sociais e de violência contra os trabalhadores urbanos e rurais. O uso de armas de fogo no tratamento dos movimentos sociais revela que a violência é parte da política deste Estado. A criminalização não é uma exceção, mas regra e necessidade de um governo, impopular e a serviço de interesses obscuros, para manter-se no poder pela força.

4. Denunciamos o Coronel Lauro Binsfield, Comandante da Brigada Militar, cujo histórico inclui outras ações de descontrole, truculência e violência contra os trabalhadores, como no 8 de março de 2008, quando repetiu os mesmos métodos contra as mulheres da Via Campesina.

5. Denunciamos o Poder Judiciário que impediu a desapropriação e a emissão de posse da Fazenda Antoniasi, onde Elton Brum seria assentado. Sua vida teria sido poupada se o Poder Judiciário estivesse a serviço da Constituição Federal e não de interesses oligárquicos locais.

6. Denunciamos o Ministério Público Estadual de São Gabriel que se omitiu quando as famílias assentadas exigiam a liberação de recursos já disponíveis para a construção da escola de 350 famílias, que agora perderão o ano letivo, e para a saúde, que já custou a vida de três crianças. O mesmo MPE se omitiu no momento da ação, diante da violência a qual foi testemunha no local. E agora vem público elogiar ação da Brigada Militar como profissional.

7. Relembrar à sociedade brasileira que os movimentos sociais do campo tem denunciado há mais de um ano a política de criminalização do Governo Yeda Crusius à Comissão de Direitos Humanos do Senado, à Secretaria Especial de Direitos Humanos, à Ouvidoria Agrária e à Organização dos Estados Americanos. A omissão das autoridades e o desrespeito da Governadora à qualquer instituição e a democracia resultaram hoje em uma vítima fatal.

8. Reafirmar que seguiremos exigindo o assentamento de todas as famílias acampadas no Rio Grande do Sul e as condições de infra-estrutura para a implantação dos assentamentos de São Gabriel.

Exigimos Justiça e Punição aos Culpados!

Por nossos mortos, nem um minuto de silêncio. Toda uma vida de luta!

Reforma Agrária, por justiça social e soberania popular!

Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra!

Sem terra é morto na fazenda Southall. Brigada diz que foi “mal súbito”. De chumbo, segundo hospital.

Aug 21st, 2009

O trabalhador rural Elton Brum da Silva foi morto na manhã de hoje (21) em São Gabriel, informa a assessoria de comunicação do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). Segundo o MST, Elton da Silva foi levado por policiais da Brigada Militar que faziam o despejo da Fazenda Southall para a Santa Casa do município. Os funcionários do hospital se negam a dar informações e dizem que devem ser obtidas com a polícia, que também está omitindo o fato. O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) lamenta com pesar o ocorrido e responsabiliza os governos e a Justiça. “Afinal, é de conhecimento público a truculência usada pela Brigada Militar nas ações de despejo. Mesmo assim, os poderes públicos optam por tratar as questões sociais, como a reforma agrária, como caso de polícia”.
A primeira explicação da Brigada Militar, publicada em ZH Online, disse que Elton morreu de “mal súbito”.
Minutos depois, o hospital de São Gabriel confirmou que o “mal súbito” foi de chumbo: um tiro no tórax.

...em São Gabriel

Em desocupação da fazenda Southall - 8.500 hectares, boa parte improdutivos - em São Gabriel, sem-terra é morto com tiro no peito pela Brigada Militar. São Gabriel é um dos maiores bastiões do latifúndio no RS. Aliás, os "pecuaristas", além de associações empresárias, são um dos maiores apoiadores do "desgoverno" Yeda. A Brigada Militar mais uma vez age com truculência, serviçal ao governo envolvido no maior caso de corrupção que o RS já viveu. Ano passado houve outros casos, como o uso de balas de borracha a curta distância e bombas de efeito moral sobre professoras em protesto na frente do Piratini, ferindo cerca de 10 pessoas(o protesto era para forçar o pagamento do salário mínimo nacional aos professores, de R$950). Semana passada, ainda em São Gabriel, sem-terras já presos, receberam choques nas algemas (para não deixar marcas corporais) com as recém recebidas armas teaser. O que deveria ser usado para humanizar a atuação da BM é usado para torturar.

http://www1. folha.uol. com.br/folha/ brasil/ult96u612 978.shtml

http://www.mst. org.br/node/ 7970

sexta-feira, 21 de agosto de 2009

quinta-feira, 20 de agosto de 2009


"Somente trabalhando com os operários e os camponeses pode-se chegar a ser um verdadeiro comunista. E é preciso que todos vejam que qualquer membro das Juventudes Comunistas é instruído e, ao mesmo tempo, sabe trabalhar. Quando todos virem que expulsamos da antiga escola o velho adestramento autoritário, substituindo-o por uma disciplina consciente, que todos os nossos jovens participam dos sábados comunistas, que utilizam as hortas suburbanas para ajudar a população, começarão a considerar o trabalho diferente de antes."

(Lênin)

Eu, que nada mais amo


Eu, que nada mais amo
Do que a insatisfação com o que se pode mudar
Nada mais detesto
Do que a insatisfação com o que não se pode mudar.

(Bertold Brecht)

ensino e educação


"Não acreditamos no ensino, na educação e na instrução se forem limitadas à escola e separadas da vida agitada."

(Lênin)

Obs. imagem do HQ V for Vendetta

toda a moralidade, reside na solidariedade

"Quando nos falam de moralidade, dizemos: para um comunista, toda a moralidade, reside na disciplina da solidariedade e união e na luta consciente das massas contra os exploradores."

(Lênin)

quarta-feira, 19 de agosto de 2009

El desierto está seco o sólo dormido?


Un niño juega a que el mar es dulce como su risa
.
Una niña es madre en medio de un salar inhóspito
.
El desierto está seco o sólo dormido?

(não sei quem escreveu, mas é bom)

Obs. o desenho faz parte da obra Galeria da Morte, Morte é uma personagem dos quadrinhos Sandman, do perfeito Neil Gaiman

A necessidade do rompimento com a exploração.


"O século 21 pode ser encarado como uma fabulosa promessa. Embora o capital e seus admiradores cultuem o lucro a qualquer preço, a duração da sua energia é menor do que o alcance de seu desejo. Nem o planeta, nem a humanidade aceitarão os seus caprichos.

A utopia socialista que aqui recolocamos, não é metafísica e sem fundamentos, ou mesmo desprezo pelos conhecimentos científicos. Marx e Engels combatem o socialismo utópico justamente porque ele apresenta limitações e ilusões idealistas e, por isso, se tornava uma mera fantasia. A utopia socialista deste século é a cobrança política que se faz às ciências para que elas revelem e atualizem as contradições e conduzam para a ruptura que dará início à construção da nova ordem. Se à utopia cabem as perguntas, às ciências cabem as respostas, para que não haja estagnação do projeto socialista, que não terá um ponto de conclusão, mas será um constante movimento para frente, tendo a continuidade da luta dos contrários em outras dimensões.

O socialismo que queremos, será científico no que diz respeito às leis do desenvolvimento da sociedade, mas não se firmará apenas sobre os fundamentos das forças produtivas e do controle do Estado. Ele será mais amplo e atingirá as consciências, tornará cultura a ética e a moral revolucionárias; fortalecerá as identidades, cuidará para não exaurir a natureza e tampouco inventará projetos que coloquem em risco a vida do planeta. Prezará pela igualdade, justiça e afetividade, e tudo aquilo que os seres sociais deste tempo novo tiverem condições objetivas e subjetivas para aperfeiçoarem a sociedade que ajudarão a construir.

Precisamos fazer uma sociedade que nos faça ser melhores; que nos dê função social e política; que nos permita amar intensamente e cultivar a dignidade como parte da cultura e da nova identidade.

Para se realizar a utopia, se impõe a necessidade de novas práticas que significarão um novo existir. A opressão tem seus limites, ela tropeça nos seus próprios passos e chegará o momento em que o rompimento será inevitável.

Se utopia é a abertura para o futuro que se torna possível neste caminhar para frente, temos a necessidade de pensar quem são e como precisam ser os homens e as mulheres deste século, em contraposição ao ser social consumidor. É a identidade desses novos seres sociais e políticos, naquilo que é peculiar ao projeto socialista, que tornará possível a aproximação entre o imaginado utópico e o acontecer concreto.

A necessidade de uma sociedade justa sem exploradores nem explorados conjugar-se-á com as inúmeras utopias particulares, de tal modo que, a atuação político-organizativa não será apenas um dever, mas um prazer. A mística alimentará as consciências com todas as esperanças e a convivência política será fraterna, pois a afetividade aproximará e manterá a unidade entre os militantes e as forças revolucionárias, embora continue existindo novas contradições criadas na própria convivência social.

A formação política e a organização de todas as pessoas se tornarão prioridade. O fazer político será acompanhado do pensamento crítico para que o destino da humanidade não seja teleguiado apenas por algumas cabeças."

(Ademar Bogo)

Obs. imagem retirada do Livro "A volta da Grauna" do ótimo Henfil.

terça-feira, 18 de agosto de 2009

nada não


Enquanto termino de ler o Bogo, e penso num próximo post, vou deixando besteiras pra ocupar espaço e descontar o vício.

segunda-feira, 17 de agosto de 2009

agricultura familiar X deserto verde

Lembrando que: uma das pautas das recentes ocupações realizadas pelo MST em todo o país foi o parcelamento da dívida bancária dos pequenos agriculturos - que quando não podem pagar sua dívida porque a planta daquele ano não deu certo, perdem seu trator, sua casa, sua terra - já os grandes latifundiários tem prazos estendidos ao infinito e ao além para parcelar o que bem entenderem.
A agricultura de hoje tende cada vez mais a não precisar de agricultores, e sim importar máquinas e sementes que qualquer um pode "operar" e só os ricos podem comprar - é a perda do domínio da técnica e definitivamente o pequeno produtor sendo tomado cada vez mais pelo grande.

A Crise Não Acabou!


Mészáros no Brasil

FORA SARNEY, pelo fim do Senado!

O Homem não vive só de política.


O homem não vive só de política.


(Leon Trotsky)

Esta idéia muito simples, é preciso que a compreendamos duma vez por todas e que nunca a esqueçamos na nossa propaganda oral ou escrita. Cada época tem a sua divisa. A história pré-revolucionária do nosso partido foi uma história de política revolucionária. A literatura de partido, as organizações de partido tudo se encontrava submetido à palavra de ordem de «política no sentido mais estreito do termo. A revolução e a guerra civil aumentaram ainda mais a acuidade e a intensidade das tarefas dos interesses políticos. Durante esse período, o partido reuniu nas suas fileiras os elementos politicamente mais ativos da classe operária. No entanto, as conclusões políticas fundamentais desses anos são claras para a classe operária no seu conjunto. A repetição mecânica dessas conclusões nada lhe trará de novo; antes poderá desvanecer na sua consciência as lições do passado. Após a tomada do poder e a sua consolidação em seguida à guerra civil, as nossas tarefas fundamentais deslocaram-se para o domínio da construção econômica e cultural, tornaram-se mais complexas, parcelaram-se, adquiriram um caráter mais detalhado e, ao que parece, mais “prosaico”. Mas, ao mesmo tempo, as nossas lutas anteriores, com o seu cortejo de esforços e de sacrifícios, não encontrarão justificação senão na medida em quê consigamos enunciar corretamente e resolver as tarefas particulares, do dia a dia, aquelas que dependem do "militantismo cultural".


Com efeito, o que é que a classe operária exatamente ganhou, o que é que obteve no decurso das suas anteriores lutas?

1) A ditadura do proletariado (por intermédio de um Estado operário e camponês dirigido pelo partido comunista).
2) O Exército Vermelho, como apoio material da ditadura do proletariado seria uma forma vazia, sem conteúdo.
3) A nacionalização dos principais meios de produção sem a qual a ditadura do proletariado seria uma forma vazia, sem conteúdo.
4) O monopólio do comércio externo, condição necessária da construção socialista perante um envolvimento capitalista.


Estes quatro elementos, cuja conquista é definitiva, constituem a armadura de aço de todo o nosso trabalho. Graças a isso, graças a essa armadura, cada um dos nossos êxitos no domínio econômico ou cultural - quando êxito real e não imaginário tornou-se necessariamente um elemento constitutivo da construção socialista.
Em que consiste hoje a nossa tarefa, que devemos nós aprender em primeiro lugar, em que sentido devemos tender? Precisamos aprender a bem trabalhar - com precisão, com limpeza, com economia. Temos necessidade de desenvolver a cultura do trabalho, a cultura da vida, a cultura do modo de vida. Após uma longa preparação e graças à alavanca da insurreição armada, derrubamos a supremacia dos exploradores. Mas não existe alavanca que possa de um só golpe elevar a cultura. Um lento processo de auto-educação da classe operária e paralelamente do campesinato, é aqui necessário. O camarada Lenin, num artigo sobre a cooperação, evoca essa mudança de direção da nossa atenção, dos nossos esforços, dos nossos métodos:


"... Somos forçados - diz ele - a reconhecer uma transformação radical do nosso ponto de vista sobre o socialismo. Essa transformação radical provém de que outrora nós colocávamos, e devíamos colocar, o centro de gravidade da nossa atividade no combate político, na revolução, na conquista do poder, etc.. Hoje, esse centro de gravidade variou a tal ponto que se deslocou para um trabalho organizacional, pacífico, cultural. Estaria pronto a dizer que, para nós, o centro de gravidade se deslocou para o militantismo cultural, se não existissem nem as relações internacionais nem a obrigação de defender a nossa situação à escala internacional. Mas se nos abstrairmos disso e nos limitarmos às relações econômicas internas, então hoje o centro de gravidade reduz-se efetivamente ao “militantismo cultural"


Assim, só o problema da nossa situação internacional nos desvia do militantismo cultural, e isso apenas em parte como em seguida veremos. O fator principal da nossa situação internacional é a defesa nacional, isto é, o Exército Vermelho. Ora, nesse domínio fundamental, as nossas tarefas relacionam-se ainda uma vez mais, em nove décimos, com o militantismo cultural; elevar o nível do exército, levar a bom termo a sua completa alfabetização, ensinar-lhe a utilizar os guias, os livros e as cartas, habituá-lo ao asseio, à exatidão, à pontualidade, à observação. Não há remédio milagroso que permita resolver imediatamente esses problemas. No fim da guerra civil, quando abordávamos uma nova fase da nossa atividade, a tentativa de criar uma «doutrina militar proletária» foi a expressão mais clara e a mais gritante da incompreensão das tarefas da nova época. Os orgulhosos projetos que visam criar uma «cultura proletária» em laboratório, procedem da mesma incompreensão. Nesta busca da pedra filosofal, o nosso desespero perante o nosso atraso une-se a uma crença no milagre, que é ela própria um sinal desse atraso. Mas não temos nenhuma razão de desesperar e é mais do que tempo de nos libertarmos dessa crença nos milagres, dessas práticas pueris de curandeiros, do gênero «cultura proletária» ou doutrina militar proletária. Para robustecer a ditadura do proletariado é necessário desenvolver um militantismo cultural quotidiano, o único a garantir um conteúdo socialista para as conquistas fundamentais da revolução. Quem não tenha compreendido isso, representa um papel reacionário na evolução do pensamento e do trabalho do partido.


Quando o camarada Lenin afirma que as nossas tarefas de hoje não são tanto políticas como culturais, é necessário entendermo-nos sobre a terminologia a fim de não interpretar erradamente o seu pensamento. Num certo sentido, a política domina tudo. O conselho .do camarada Lenin de transferir a nossa atenção do domínio político para o domínio cultural, é um conselho político. Quando um partido operário, em tal ou tal país, decide que é necessário num dado momento colocarem primeiro plano as exigências econômicas e não as políticas, essa decisão tem um caráter «político». É perfeitamente evidente que a palavra «políticos, é utilizada aqui em dois sentidos diferentes: em primeiro lugar num sentido largo, materialista-dialético, englobando o conjunto das idéias diretivas, dos métodos e dos sistemas que orientam a atividade da coletividade em todos os domínios da vida social; em segundo lugar, num sentido estreito, especializado, caracterizando uma certa parte da atividade social, intimamente ligada à luta pelo poder e oposta ao trabalho econômico, social, etc.. Quando o camarada Lenin escreve que a política é economia concentrada, encara a política no sentido largo, filosófico. Quando o camarada Lenin diz: «um pouco menos de política, um pouco mais de economia», encara a política no sentido estreito e especializado do termo. As duas acepções são igualmente válidas visto que legitimadas pelo uso. Importa apenas compreender bem do que se faia em cada um dos casos.


A organização comunista é um partido político no sentido amplo, histórico, ou, se prefere, filosófico do termo. Os outros partidos atuais são políticos unicamente no sentido em que fazem (pequena) política. Se o nosso partido transfere a sua ação para o domínio cultural, isso de modo nenhum significa que enfraqueça o seu papel político. Historicamente, ò papel dirigente (isto é, político) do partido, manifesta-se precisamente nessa deslocação lógica da sua atenção para o domínio cultural. Só após longos anos de atividade socialista, conduzida com êxito no interior e garantida no exterior, é que o partido poderá libertar-se pouco a pouco da sua carapaça "partisan" (2) para se confundir com a comunidade socialista. Mas isso está ainda tão longe que se torna inútil antecipar sobre o futuro... No imediato, o partido deve conservar totalmente as suas características fundamentais: coesão ideológica, centralização, disciplina, e, correlativamente, combatividade. Mas precisamente essas inestimáveis qualidades de "espírito de partido" comunista não podem manter-se e desenvolver-se se não se satisfazem as exigências e as necessidades econômicas e culturais de forma mais completa, mais hábil, mais exata e mais minuciosa. Em conformidade com essas tarefas, que devem desempenhar hoje um papel preponderante na nossa política, o partido reagrupa, distribui as suas forças e educa a jovem geração. Por outras palavras, a grande política exige que na base do trabalho de ,agitação, de propaganda, de repartição de forças, de instrução e de educação, sejam hoje colocadas tarefas e exigências econômicas e culturais e não exigências «políticas» no sentido estreito do termo.


A poderosa unidade social que representa o proletariado surge em toda a sua amplitude nas épocas de luta revolucionária intensa. Mas no interior dessa unidade, observamos ao mesmo tempo uma incrível diversidade e mesmo uma grande heterogeneidade. Do pastor obscuro e inculto ao maquinista altamente especializado escalona-se toda uma variedade de qualificações, de níveis culturais, de hábitos de vida. Cada camada social, cada oficina de empresa, cada grupo, é constituído por indivíduos de idade e caráter diferentes, de passado diversificado. Se não existisse essa diversidade, o trabalho do partido comunista no domínio da educação e da unificação do proletariado seria de todo simples. Mas, pelo contrário, o exemplo da Europa prova-nos quanto esse trabalho é na realidade difícil. Pode dizer-se que quanto mais a história de um país, e portanto a própria história da própria classe operária, é rica, mais reminiscências, tradições e hábitos nela se encontram; quanto mais os grupos sociais nela são antigos, mais difícil é realizara unidade da classe operária. O nosso proletariado quase não tem história nem tradições. Isso facilitou sem dúvida a sua preparação para a Revolução de Outubro. Mas, em contrapartida, isso torna mais difícil a sua construção após Outubro. O nosso operário (com exceção da camada superior) ignora inclusivamente os hábitos culturais mais elementares (desconhece, por exemplo, o asseio e a exatidão, não sabe ler nem escrever, etc.). O operário europeu adquiriu pouco a pouco esses hábitos no quadro do regime burguês: é por isso - vê-se nas camadas superiores - que está tão fortemente ligado a esse regime, com a sua democracia, a sua liberdade de imprensa e outros bens do mesmo gênero. Entre nós, um regime burguês tardio quase nada deu ao operário; foi justamente por isso que, na Rússia, o proletariado pôde romper e derrubar mais facilmente a burguesia. Mas é também pela mesma razão que o nosso proletariado, na sua maioria, é obrigado a adquirir hoje, isto é, no quadro de um governo socialista operário, os mais simples hábitos culturais. A história nada dá gratuitamente: se faz um desconto numa coisa, sobre política, vai recuperá-lo por outro lado, sobre a cultura. Quanto mais fácil foi (relativamente, entenda-se) ao proletariado russo fazer a revolução, tanto mais lhe será difícil realizar a construção socialista. Mas, em compensação, a armadura da nossa nova sociedade, forjada pela revolução e caracterizada pelos quatro elementos fundamentais citados no princípio deste capítulo, imprime um caráter objetivamente socialista a todos os esforços conscientes e nacionais no domínio da economia e da cultura. O operário, em regime burguês, sem o querer e sem mesmo o saber, enriquece a burguesia e enriquece-a tanto mais quanto melhor trabalha. No Estado soviético, o operário consciencioso, mesmo sem nisso pensar nem com tal se preocupar (se é sem-partido e apolítico) realiza um trabalho socialista, aumenta os meios da classe operária. Está aí precisamente todo o sentido da Revolução de Outubro, que a N.E.P. em nada modificou.


Existe um enorme número de operários sem partido, profundamente dedicados à produção, à técnica, à máquina. Deve falar-se com reserva do seu “apolitismo, isto é, da sua ausência de interesse pela política. Nos momentos difíceis e importantes da revolução estiveram ao nosso lado. Na sua grande maioria, Outubro não os assustou, não desertaram nem traíram. Quando da guerra civil, numerosos dentre eles estiveram na frente e outros trabalharam para equipar o exército. Depois regressaram ao trabalho pacífico. Chamou-se-lhes apolíticos, e não sem fundamento, porque colocam o seu trabalho ou o seu interesse familiar mais alto do que o interesse político, pelo menos durante os períodos «calmos». Cada um deles quer tornar-se um bom operário, aperfeiçoar-se, elevar-se a um nível superior, tanto para melhorar a situação da sua fábrica como devido a um amor próprio profissional legítimo. Cada um deles, como já dissemos, realiza um trabalho socialista mesmo que não tenha fixado isso como objetivo. Mas o que nos interessa a nós, partido comunista, é que esses operários-produtores tenham uma clara consciência da ligação existente entre a sua particular produção quotidiana e os fins da construção socialista no seu conjunto. Os interesses do socialismo estarão assim melhor garantidos e esses produtores individuais retirarão disso uma satisfação moral bastante maior.


Mas como chegar a isso? É difícil sustentar com este tipo de operários questões de política pura. Já escutou todos os discursos. Não se sente atraído pelo partido. O seu pensamento só desperta quando está junto da sua máquina e, de momento, aquilo que não o satisfaz é a ordem que existe na oficina, na fábrica, no trust. Esses operários procuram ir tão longe quanto possível na sua reflexão; são freqüentemente reservados; vê-se sair das suas fileiras os inventores autodidatas. Não é de política que se lhes deve falar, não é pelo menos isso que os apaixonará ao primeiro contato, más, em compensação, pode e deve falar-se-lhe de produção e de técnica.
Um dos participantes na reunião dos agitadores moscovitas, o camarada Koltsov (do bairro de Krasnáia Presnia) sublinhou a enorme falta de manuais, de livros de estudo, de obras sobre especialidades técnicas ou outras profissões particulares. Os velhos livros estão esgotados; aliás, alguns dentre eles envelheceram no plano técnico, enquanto que no plano político estão geralmente impregnados dum servil espírito capitalista. Quanto aos novos manuais, existe um ou dois no máximo; é difícil encontrá-los porque foram editados em momentos diferentes por empresas ou serviços diversos, fora de todo o plano geral. Não são sempre tecnicamente válidos: são com freqüência demasiado teóricos e acadêmicos; enquanto que, politicamente, estão em geral não referenciados, não sendo no fundo mais do que a tradução de obras estrangeiras. Temos necessidade de uma série de novos manuais de algibeira: para o serralheiro soviético, para o torneiro soviético, para o eletricista soviético, etc.. Estes manuais devem adaptar-se à nossa técnica e à nossa economia atuais, devem ter em conta a nossa pobreza assim como as nossas imensas possibilidades, devem visar a desenvolver na nossa indústria métodos e hábitos novos muito mais racionais. Devem ainda, numa medida mais ou menos larga, evidenciar as perspectivas socialistas do ponto de vista das necessidades e dos interesses da própria técnica (é aqui que se localizam os problemas de normalização, de eletrificação, de economia planificada). Em tais obras, as idéias e as conclusões socialistas devem integrar-se na teoria prática de tal ou tal setor de atividade. De modo nenhum devem ter caráter de agitação supérflua e inoportuna. É enorme a procura para essas edições, devido à carência de operários qualificados, e ao desejo, por parte dos próprios operários, de elevar a sua qualificação. Essa procura acentua-se pela baixa de produtividade registrada no decurso da guerra civil e imperialista. Temos aqui uma tarefa extremamente importante e útil a realizar.


Não se pode certamente ignorar quanto é difícil redigir esses manuais. Os operários, mesmo os altamente qualificados, não sabem escrever livros. Os escritores especializados que abordam certos problemas ignoram com freqüência os seus aspectos práticos. Finalmente, entre estes, poucos há que possuam um pensamento socialista. No entanto, este problema só pode encontrar uma solução combinada e não «simples», isto é, rotineira. Para escrever um manual, é preciso reunir um grupo de três pessoas (troika) formado por um escritor especialista, tecnicamente informado, que conheça - ou que seja capaz de conhecer - o estado do ramo correspondente da nossa produção, por um operário altamente especializado nesse domínio, de espírito inventivo, e por um escritor marxista, com formação política e com alguns conhecimentos no campo da técnica e no da produção. Quer se utilize esta solução ou outras análogas, permanece a necessidade de pôr em marcha uma biblioteca exemplar de obras técnicas destinadas às oficinas, convenientemente encadernadas, de formato prático e pouco dispendiosas. Semelhante biblioteca desempenharia um duplo papel: favoreceria a elevação da qualificação do trabalho e por conseqüência o êxito da construção socialista; ajudaria, ao mesmo tempo, a reunir um grupo de operários-produtores extremamente válidos para a economia soviética no seu conjunto e, portanto, para o partido comunista.


Sem dúvida que não se pode ter por limite único uma série de manuais de estudo. Se nos detivemos de forma tão detalhada sobre esse particular problema foi porque ele nos oferece, ao que parece, um exemplo bastante evidente da nova abordagem ditada pelos problemas do período atual. A luta pela conquista ideológica dos proletários “apolíticos” pode e deve ser conduzida por meios diversificados. É preciso editar semanários ou mensários científicos e técnicos especializados por sector de produção; é preciso criar sociedades científicas e técnicas destinadas a esses operários. É com vista a eles que, numa boa metade, deve orientar-se a nossa imprensa profissional se de fato não quer ser uma imprensa destinada unicamente ao pessoal dos sindicatos. Mas o argumento político mais convincente para os operários desse tipo consistirá em cada um dos nossos êxitos práticos no domínio industrial, em cada organização real do trabalho na fábrica ou na oficina, em cada esforço ponderado do partido nessa direção.


Pode formular-se da maneira seguinte o ponto de vista político do operário-produtor que presentemente nos interessa e que raramente exprime as suas idéias: “quanto à revolução e ao derrube da burguesia, nada há a opor, houve razão em fazê-lo. Não temos necessidade da burguesia. Não temos também necessidade dos representantes mencheviques ou outros. No que respeita à “liberdade de imprensa?”- isso não é de tanta importância e não é esse o fundo do problema. Mas como ides vós resolver o problema da economia? Vós, comunistas, haveis tomado a direção dos negócios. Os vossos fins e os vossos planos são válidos, sabemo-lo, é inútil repeti-lo, houvemo-los, estamos de acordo, damo-vos o nosso apoio, mas, vejamos, como ides resolver praticamente esses problemas? Até ao presente, não vale a pena escondê-lo, aconteceu-vos com freqüência pôr o dedo onde não era devido. Sabemos que não se pode agir bem à primeira, que é preciso aprender, que os erros são inevitáveis. Sempre assim sucede. E visto que suportamos os crimes da burguesia, suportaremos tanto mais os erros da revolução. Mas isso não durará eternamente. Entre vós, comunistas, existe gente diferente entre si, como aliás também entre nós sucede, pobres pecadores: certos há que estudam realmente, fazem conscienciosamente o seu trabalho, diligenciam chegar a um resultado econômico prático, enquanto que outros se limitam à pantominice. E os pantomineiros são muito prejudiciais, porque o trabalho se lhes escapa por entre os dedos ...”. Este tipo de operário, eis o que ele é: torneiro, serralheiro ou fundidor zeloso, hábil e atento ao seu trabalho; não é entusiasta, é antes politicamente passivo, mas reflete, tem espírito crítico; é por vezes um pouco cético, mas mantém-se sempre fiel à sua classe; é um proletário de valor. É em direção a este tipo de operários que o partido deve atualmente dirigir os seus esforços. O nosso grau de implantação nessa camada social - na economia, na produção, na técnica - será o índice mais seguro dos nossos êxitos em matéria de militantismo cultural, encarado no seu sentido mais amplo, no sentido leninista do termo.


Dirigir os nossos esforços para o operário consciencioso, de modo nenhum contradiz, claro está, a tarefa primordial do partido que consiste em enquadrar a jovem geração do proletariado, porque esta jovem geração se desenvolve em condições precisas; forma-se, fortalece-se e endurece-se resolvendo determinados problemas. A jovem geração deve, antes de mais, ser uma geração de operários especializados, altamente qualificados, amantes do seu trabalho. Deve adquirir consciência de que a sua produção serve ao mesmo tempo o socialismo. A atenção dispensada à aprendizagem, o desejo de adquirir uma alta qualificação, aumentará, aos olhos da juventude, a autoridade dos «velhos» operários, que, como já se disse, permanecem na maioria fora do partido. Ao mesmo tempo que dirigimos os nossos esforços para o operário consciencioso e hábil, devemos também aplicar-nos em educar a juventude proletária. Sem isso, seria impossível seguir em frente, rumo ao socialismo.