domingo, 28 de fevereiro de 2010

Eu sou a garota anacronismo!

Girl Anachronism - Dresden Dolls
(tradução)


você pode notar pelas cicatrizes nos meus braços,
e os machucados no meu quadril,
e os amassados no meu carro,
e as bolhas nos meus lábios,
que eu não sou a garota mais cuidadosa do mundo


você pode notar o vidro no chão

e os cordões que se quebram
e eles continuam a se quebrar

e parece que estou tremendo

mas é só a febre
e lá vou de novo
se estivesse mais frio eu poderia me dissolver

se eu fosse mais velha eu agiria de acordo com a minha idade

mas eu nao acho que você acreditaria em mim

não
é o jeito que eu deveria ser é
só o jeito que a operação me fez

e você pode notar
pelo estado do meu quarto
que eles me liberaram muito cedo

e os remédios que eu tomei
vieram alguns anos tarde demais
e eu tenho algumas questões pra lidar

lá vou eu de novo fingindo que sou você
fazendo de conta que eu tenho uma alma por trás dessa superfície
tentando te convencer
de que isso foi acidentalmente de propósito
eu não sou tão séria

essa paixão é só um plágio

mas eu posso entrar pro seu século

mas só em uma rara ocasião

eu fui retirada antes da dor do parto passar
e agora
contemple o pior acidente do mundo
eu sou a garota anacronismo!

e você pode notar pelo vermelho nos meus olhos

e os hematomas nas minhas coxas

e os nós no meu cabelo

e a banheira cheia de moscas
que eu não estou certa de forma alguma

lá vou eu de novo
fingindo que vou cair
não chame os médicos
porque eles já viram tudo isso antes
eles vão dizer:
"apenas deixe ela se espatifar e queimar, ela vai aprender, a atenção só a encoraja..."
e você pode notar o gesso no meu corpo inteiro

que eu sinto muito por ter perguntado

apesar de você ter feito de tudo
(como qualquer pessoa decente teria)
mas eu posso ser contagiosa
então não toque
você vai começar a acreditar que é imune à gravidade e essas coisas
não me molhe
porque senão os curativos vão se desprender
e você pode notar
pela fumaça na estaca
que o estado atual é crítico bem,
são essas pequenas coisas,
por exemplo:
no tempo que leva para quebrar
ela pode inventar dez desculpas

"por favor, desculpe-a pelo dia,
é só o efeito que os medicamentos fazem sobre ela"

eu nao necessariamente acredito que exista cura pra isso

então eu posso entrar pro seu século,
mas apenas como uma hóspede duvidosa

eu fui precariamente removida numa cesária

contemple o pior acidente do mundo,

eu sou a garota anacronismo!

Noite das Rosas

A Night At The Roses
(tradução)

Você deveria se enxergar
Quando você vai crescer?
Cada botão que você entrelaça naquela máquina é como uma forquilha

Mas eu fui apenas o tolo
Que você estava esperando
Quem disse que nós não podemos
Nos tocar para evitar o tédio?
Nada é mais comovente, isso é certo

Um anel em volta das rosas

Eu vou assistir você tocar
Eu venho aqui toda noite
Sou só eu, o garçom, a garçonete e as luzes
Iluminando você, não entendendo muito bem
Nós não aplaudimos você, mas sim a sua generosidade

Um anel em volta das rosas
Todo mundo faz poses
Ameaças em seguida retiradas
No momento em que você coloca suas roupas

Um anel em volta das rosas
Todo mundo já conhece
Eu vou cantar seus temores
Se você cantar minha neurose

Você não deveria se retirar
Nenhuma noite cedo demais
Eu ainda estarei aqui quando a última pobre alma deixar o salão
Permanecendo aqui, assim como um bom amigo deveria
Sorrindo como se suas músicas fossem boas

Um anel em volta das rosas
Todo mundo faz poses
Ameaças seguidas de retiradas
No momento em que você coloca suas roupas

Um anel em volta das rosas
Todo mundo já conhece
Eu vou cantar seus temores
Se você cantar minhas neuroses

E eu sentei lá durante horas
Esperando no meio-fio
Pensando que você gostaria de receber uma flor de uma garota bonita
Um anel em volta da garçonete vinda da poesia
Um anel de fogo em volta da porta das rosas
Coloque-o antes que você perca seu vigor

Coloque as suas mãos juntas e elas vão doer
Coloque as suas mãos juntas e elas vão doer
Coloque as suas mãos juntas e elas vão doer
Coloque as suas mãos juntas e elas vão doer
Coloque as suas mãos juntas e elas vão doer

Faça da sua música algo que ninguém nunca ouviu
Faça da sua música algo que ninguém nunca ouviu

E eu espero que nós tenhamos o que merecemos...

Pesquisa Comentada

Estava lendo uma pesquisa - daquelas abobadinhas que todo norte-americano adora fazer - e resolvi postar e comentar (porque sou desocupada como um norte-americano). O escrito em preto é do site Terra, o escrito em vermelho comunismo (novo tom de vermelho by me) é meu.

Dezenas de universidades, institutos de pesquisas e laboratórios passam seus tempos tentando entender o que realmente atrai o sexo oposto. Confiraaa!

1)Ofereça álcool à menina (de preferência vinho tinto): uma pesquisa divulgada em maio e realizada em nove países europeus constatou que 23% das moças bebem nas baladas para aumentar suas chances de terem sexo. E mais, na Itália pesquisadores provaram que o vinho tinto deixa as mulheres mais safadas já que é vaso-dilatador e aumenta a irrigação do sangue nos órgãos. Todos, diga-se de passagem.
Não precisa que nenhuma universidade estude porcaria nenhuma pra saber que vinho deixa as mulheres MUITO com vontade.

2)Procure encontrar mulheres espiritualizadas e sem formação acadêmica: essa veio dos Estados Unidos e foi publicada no Terra e mostrou que moças mais espiritualizadas e que acreditam na conectividade com outros seres humanos fazem mais sexo. Outro estudo mostrou que as religiosas (o que não tem nada a ver com espiritualizada em si) são o grupo que menos pratica a cópula, assim como as que têm diploma universitário.
Sou uma universitária que curte o negócio, o problema não é nós, são os macho que não sabem conversar.
Sobre espiritualizadas não conheço a causa.

3)Faça trabalhos domésticos e deixe elas saberem: também proveniente da Europa, o estudo mostrou que os homens que se dispõem a ajudar na casa e a criar os filhos fazem mais sucesso que os machões que não se levantam da poltrona nem para pegar uma cerveja na geladeira.
Homem que cozinha e lava louça é TUDO de bom.

4)Passe a cantada no ouvido direito: pesquisadores italianos testaram e provaram que uma pessoa se torna mais receptível quando a informação é dita em seu ouvido direito já que está diretamente relacionado ao lado esquerdo do cérebro, que é mais lógico e processa informações verbais.
Delícia!

5) Entenda que bombons não são só um mimo e sim uma arma estratégica: outra vez, nossos amigos da terra de Berlusconi, mostraram que o chocolate preto (aquele com mais cacau) altera positivamente a libido feminina por ser rico em antioxidantes, assim como o vinho tinto.
Eu como chocolate quando tô depre. Não achei essa muito eficiente.

6)Tenha um visual macho para as meninas que não tomam pílula: os anticoncepcionais, ao agir nos hormônios femininos, fazem com que elas procurem homens com ar mais feminilizados ou infantis, segundo estudo americano. Já aquelas que não tomam pílula, preferem, especialmente no período fértil, machos típicos com barba por fazer e peito peludo. Leve muita camisinha para não comemorar o Dia dos Pais depois.
Eu tomo pílula e realmente tenho gostos considerados, hãm, exóticos.

7)Pense como um nerd: uma pesquisa informal realizada por um site de games apontou os geeks, tecnólogos e nerds como os homens que mais se preocupam com o prazer sexual feminino e os que mais aceitam brinquedos sexuais na hora da transa.
Delícia!

8)Saiba beijar muito bem: está cientificamente provado que é através do beijo que ocorre a escolha definitiva de um parceiro, mesmo porque o cérebro humano é mais dedicado a colher informações através da língua e dos lábios do que, por exemplo, das costas. E isso é muito mais forte entre as mulheres do que em homens.
Geralmente só beijo quem quero pra outras coisas (raramente os demais), então não entendo dessa pesquisa.

9)Escolha mulheres que malham e usam salto alto: um estudo do site orgasmsurvey.com mostrou que as fanáticas por academia têm mais probabilidade de terem orgasmos. Já a cientista italiana Maria Cerruto provou que o uso de salto alto fortalece os músculos da pélvis, o que leva a mais prazer na hora do sexo e obviamente a mais vontade de fazer sexo.
Não curti. Hunf! Besteira. E isso que vou à academia todo dia. Mulheres de salto todo dia na minha opinião são inseguras de si que se submetem a usar coisas desconfortáveis.

10)Coma mais melancia: um estudo de um instituto texano constatou que comer melancia traz os mesmos efeitos que o Viagra já que afeta os vasos sanguíneos e aumenta a libido masculina. Tudo isso graças à substância citrulina que é transformada em arginina pelos hormônios humanos e age na circulação do sangue.
Melancia a gente se baba tudo comendo, não gosto. Mas os velinhos morreriam menos do coração.

Fonte: Terra

Heart in a Cage

Heart in a cage
(The Strokes)

Well I don't feel better

When I'm fucking around

And I don't write better

When I'm stuck in the ground

So don't teach me a lesson
'Cause I've already learned
Yeah the sun will be shining

And my children will burn

Oh the heart beats in this cage
I don't want what you want
I don't feel what you feel

See I'm stuck in a city

But I belong in a field
Yeah we got left, left, left, left, left, left, left

Now it's three in the morning and you're eating alone
Oh the heart beats in this cage

All our friends, they're laughing at us

All of those you loved you mistrust

Help me I'm just not quite myself

Look around there's no one else left

I went to the concert and I fought through the crowd
Guess I got too excited when
I thought you were around

Oh he gets left, left, left, left, left, left, left

I'm sorry you were thinking;
I would steal your fire.

The heart beats in this cage

Yes the heart beats in this cage

Alright.
And the heart beats in this cage.

Mais arte erótica. Do site Erotica. :)









quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010

Guerra da Água completa 10 anos, mas, junto aos frutos políticos da vitória popular, são colhidos amargos fracassos administrativos.

Vinicius Mansur para o Brasil de Fato - www.brasildefato.com.br

A Guerra da Água – massiva mobilização popular que expulsou a transnacional que geria o sistema de água potável e esgoto de Cochabamba, região central da Bolívia, em 2000 – completa uma década este ano, que marcam também o início da derrota do modelo neoliberal e o começo do atual “processo de mudança”.

Para a Federação Departamental Cochabambina de Regantes (Fedcor), que organiza os moradores de comunidades rurais e urbanas dotadas de sistemas comunitários de água, a guerra, porém, começou ainda em 1999. Atentos ao problema dos recursos hídricos, a Fedcor foi vanguarda na luta contra a privatização do sistema de água potável e esgoto de Cochabamba, realizando bloqueios já nos dias 4 e 5 de novembro daquele ano.

“Criaram a lei 2029 para permitir a privatização, mas não só venderam a empresa pública [Semapa] como permitiram a Águas do Tunari [consórcio de empresas beneficiado] ser dona de todas as fontes de água”, explica Carmen Peredo, atual senadora suplente pelo Movimento ao Socialismo (MAS) e então dirigente da Fedcor. De acordo com o representante da organização Água Sustentável, Oscar Campanini, os regantes se levantaram primeiro porque o contrato significava a perda de sistemas comunitários que sequer haviam sido criados pelo Estado. “Nas áreas rurais, eles são anteriores até mesmo à Bolívia, foram criados durante o Império Inca, com o trabalho e o dinheiro da comunidade, geridos até hoje de forma comunitária pelas organizações camponesas ou indígenas. Nas áreas urbanas, diante da ausência do Estado na periferia, estes sistemas são a mescla da experiência organizativa dos mineiros, que migraram para a cidade com o desmonte do setor pelo neoliberalismo, com essa tradição comunitária daqueles que migraram da área rural. Só na zona sul de Cochabamba existem cerca de 100 sistemas comunitários que atendem a quase 200 mil pessoas. Nos municípios do entorno, são cerca de 800”, relata Campanini.

Porém, em janeiro do ano 2000, o anúncio de incremento de mais de 100% nas tarifas feito por Águas do Tunari cai como uma bomba na cidade Cochabamba e dá início a um massivo e extenso processo de mobilização que ocupa as ruas da cidade, e até mesmo de outros departamentos bolivianos, até abril de 2000, quando a empresa é expulsa do país. A população se revolta contra o consórcio encabeçado pela estadunidense Bechtel, que prometeu um projeto de 300 milhões de dólares para resolver os problemas de abastecimento da cidade, mas que, em sua conformação, concretizada dois dias antes da assinatura do contrato de concessão, declarava, em sua ata de fundação, apenas 10 mil dólares de capital.

As vitórias políticas

Para Ramiro Saravia, militante da Rede Tinku – organização político-cultural que tem como sede a principal praça da cidade (14 de Setembro) –, a Guerra da Água “foi uma escola de participação, de gente na rua e na praça que perdeu o medo e passou a ter confiança em si, articuladas pela Coordenadora da Água e da Vida”, instância que dirigiu as mobilizações e aglutinou todos os setores de Cochabamba, organizados ou não, “com democracia direta, da forma como sempre sonhamos”, relembra Saravia.

“Foram quase seis meses de mobilização permanente, todas as ruas, highlones [burguesas] ou não, estavam bloqueadas, sem exceção. Foi a primeira vez, depois de muito tempo, que se viu a unidade de diferentes classes e a aliança do campo com a cidade”, relata a senadora suplente do MAS.

Segundo o historiador, diretor da escola de formação política itinerante do MAS e prefeito interino de Cochabamba em 2008, Rafael Puente, “a novidade política foi a capacidade de auto-organização massiva na cidade”. Contudo, ele ressalta que o movimento não teria tal magnitude “se não estivesse permanentemente respaldado por um cordão camponês que apoiava e defendia a mobilização urbana, tanto na Cordilheira, como no Vale e no Trópico de Cochabamba”. De acordo com Puente, a guerra foi o ponto de inflexão do modelo neoliberal, “a primeira de muitas demonstrações de que a manutenção do modelo no país só seria possível a ferro e fogo” e, por isso, o início do atual processo de cambio.

Ele conta que, “pela primeira vez, a mobilização social não levantava uma bandeira de volta ao passado, à Revolução de 1952, mas uma visão adiante. A consigna era clara: a gestão social da água. O quarto grande bloco histórico da vida republicana do país, que foi o modelo neoliberal, se manteve intacto até 2000. Mas a expulsão de Águas de Tunari foi a sua primeira grande ferida”.

Segundo a senadora suplente Peredo, os guerreiros da água influíram de forma direta na Nova Constituição Política de Estado, colocando os recursos hídricos como um direito humano fundamental e estabelecendo “cadeados jurídicos que impedem a volta da tragédia”. Campanini afirma que a experiência acumulada com o conflito levou a Bolívia a encabeçar a luta pelo reconhecimento da água como um direito nos fóruns internacionais, “mas isso não é realidade porque países maiores, como o Brasil, jogam para o outro lado”.

Outros legados da Guerra da Água destacados por Campanini são a expulsão da transnacional franco-belga Suez de El Alto, em 2005, o aumento dos investimentos do Estado boliviano em água e o aumento da visibilidade dos sistemas comunitários: “Os anteriores governos atendiam, e mal, à parte central das cidades e o campo, mas não às zonas peri-urbanas, que têm uma gestão comunitária muito interessante, mas precisam de ajuda técnica e de infra-estrutura. Com a luta, eles são vistos pelas políticas públicas e já ganharam boa parte dos fundos públicos para o setor”.

A dívida histórica

Porém, segundo Puente, a bonita história do exercício do poder popular não conseguiu resolver velhos problemas. “Temos que dizer com frieza: essa gestão social não existe, a administração segue ineficiente, injusta e cara. Houve uma modernização tecnológica, aumentou um pouco as conexões, mas nada perto do que se esperava. Ganhamos a guerra, mas não conquistamos a paz”.

Segundo Campanini, cerca de 50% da rede deveria ser reinstalada, porque, do volume total captado pela Semapa, metade se perde com vazamentos. “Trabalhadores já comentaram que foram trocar tubos em alguns lugares, cavaram, mas não os encontraram. Os tubos estavam tão desgastados que eram simplesmente canais de terra ou pedra”, conta. Outro problema está nas conexões clandestinas manipuladas por grupos de trabalhadores da empresa e por políticos. “Aí esses grupos cobram por fora e, aliados a segmentos políticos, fazem chantagem eleitoral com a população prometendo novas conexões”, denuncia.

Em Cochabamba, boa parte da população ainda se abastece de carros-cisterna privados que cobram 20 bolivianos (R$ 5,27) pelo metro cúbico de água de baixa qualidade. A mesma quantidade, e de boa qualidade, fornecida pela Semapa custa, em média, 3 bolivianos.

“Eu pago mais de água do que luz e com freqüência temos escassez de água, em toda cidade. E a Semapa ainda contratou outra empresa só para efetuar cortes de quem não paga, é incrível”, relata, cabisbaixo, Saravia.

Mais triste do que constatar a continuidade de problemas estruturais, é ouvir porque o movimento que expulsou uma transnacional não assumiu o controle da empresa. Segundo o historiador Puente, “os dirigentes começar a disputar a notoriedade. Os dirigentes da Coordenadora claudicaram e vários deles aproveitaram o papel importante que tiveram para obter vantagens pessoais e passaram a partidos de direita”. Saravia afirma que a Coordenadora funcionou bem até 2002, quando chegaram as eleições e todos os 15 principais dirigentes foram candidatos. “Ofereceram deputação até para nós, mas não aceitamos porque o princípio da Coordenadora era a decisão conjunta, mas quando vimos todos já tinham decidido e estávamos sós”.

Na visão de Peredo, ex-dirigente da Fedcor, que tinha assento na direção da Coordenadora, o órgão se diluiu “porque outros companheiros tinham sua própria ótica e não havia a mesma linguagem”, gerando uma paralisia na organização que foi fundada no consenso. “Perdemos muito tempo e quando não fazemos a coisa no calor do momento, perdemos a oportunidade. Demoramos meses para fazer um novo estatuto da Semapa, mas havia muitas divergências sobre como deveria ser a empresa. Temos uma dívida histórica”, concluiu.

O sindicalista Oscar Oliveira, consolidado na opinião pública como principal dirigente da guerra, é apontado como um dos principais responsáveis pela má condução da reestatização por Puente. “Ele superestimou o momento histórico e seu papel, dizendo já em 2000 que o tema da água já era pequeno e que se dedicaria a lutar contra tudo o que foi o processo de capitalização das empresas públicas na Bolívia. Evidentemente era a batalha central, mas que se deu com o tempo. Assim, deixou a questão para Jorge Alvarado, um companheiro com méritos, mas que se isolou em meio às disputas e se perdeu na burocracia”.

O integrante da Rede Tinku, Saravia, eleva a crítica à Oliveira. “Fizeram da luta um negócio e com o dinheiro que deram a Cochabamba o Oliveira criou a Fundação Abril, que se especializou no tema água”.

Até mesmo o pequeno avanço conseguido na gestão da empresa – a eleição direta pela população de três diretores da Semapa – se perdeu. Segundo Puente, “no primeiro ano teve certo efeito, elegendo lutadores que participaram da luta, mas alguns deles tardaram pouco a somar-se à burocracia e à corrupção nessa e em outra instâncias. E a fé da cidadania diminuiu tão rapidamente que faz dois anos um candidato era eleito por 400 votos, num universo de 300 mil eleitores”.

Mesmo diante de tantas decepções, Saravia comenta que a derrota do neoliberalismo foi tão acachapante que o discurso privatista não ressurgiu. “O povo sabe que isso é pagar mais. O povo quer que melhore o serviço e que não haja corrupção”, sentenciou.

Cronologia:

3 de setembro de 1999 – Assinado contrato entre governo e Águas do Tunari.

20 de outubro – Promulgada lei 2029, chamada de “Serviço de Água Potável e Esgoto”.

4 e 5 de novembro – Os regantes iniciam os bloqueios de ruas e estradas.

12 de novembro – Criação da Coordenadora da Água e da Vida.

11, 12 e 13 de janeiro de 2000 – A Coordenadora organiza um grande bloqueio contra o aumento das tarifas em mais de 100% e contra a lei 2029. Governo se compromete a rever as tarifas e a lei.

4 e 5 de fevereiro – A Coordenadora realiza a tomada de toda cidade e o Exército vai às ruas. Governo assina documento se comprometendo a retomar as tarifas anteriores.

26 de março – A Coordenadora realiza um referendo com mais de 50 mil votantes a favor da expulsão de Águas do Tunari.

4 de abril – Convocação de bloqueio indefinido.

6 de abril – Em reunião de negociação, prefeitura declara preso os dirigentes e governo central declara estado de sítio. Cerca de 50 mil pessoas tomam a praça central, onde está a sede da prefeitura. O prefeito volta atrás, desmente o estado de sítio e comunica a saída de Águas do Tunari da cidade.

7 de abril – Governo central nega o rompimento do contrato. Prefeito de Cochabamba renuncia e um novo estado de sítio é declarado. 22 dirigentes são presos.

8 de abril – As estradas de todo o Altiplano da Bolívia são bloqueadas, os enfrentamentos crescem e deixam um morto. Mas exército e polícia se retiram aos quartéis e a cidade fica nas mãos dos manifestantes.

9 de abril – Aniversário da Revolução de 1952. Autoridades pertencentes ao MNR (partido da Revolução) comparecem ao enterro do jovem assassinado e são agredidos pelos manifestantes. Governo central anuncia saída de Águas do Tunari.

10 de abril – A Coordenadora exige documento do governo oficializando sua posição. Ele se nega e acusa a rebelião de Cochabamba de ser fruto do “narcotráfico”. Manifestantes iniciam marcha massiva e governo realiza a rescisão do contrato.

11 de abril – Parlamento aprova a lei com as modificações propostas pela Coordenadora. No campanário da Igreja localizada na praça central de Cochabamba, é encontrado enforcado o jovem Juan Rodriguez, responsável por, durante a guerra, avisar a população da chegada do Exército e da Polícia com os toques do sino.

12 de abril – Terminam os bloqueios.

14 de abril – Presos são libertados e familiares de mortos e feridos indenizados.

*Dados retirados do livro “La guerra por el agua y por la vida”, de Ana Esther Ceceña. Um documentário sobre a Guerra da Água no endereço eletrônico

http://www.fundacionabril.org/detallesvideolista0.php?codigo_trailer=7&tema_trailer=Guerra%20del%20Agua.

O Projeto Popular em 2010 - por Frederico Santana Rick

http://www.correiocidadania.com.br/content/view/4361/9/

Em 1997, lutadores e lutadoras dos movimentos populares e militantes comprometidos com um Projeto Popular para o Brasil, após intensas marchas do MST, realizaram a Conferência de Itaici. Estavam ali grandes lideranças de todos os estados e segmentos sociais da esquerda brasileira, incluindo diversos partidos, movimentos rurais e urbanos, pastorais e sindicais. A preocupação era uma só: o resgate de valores e práticas militantes rumo à transformação do Brasil, através da construção de um amplo processo de participação do povo nos destinos da nação. Isso exigia retomada do trabalho de base, da formação política e das lutas de massa.

Da Conferência de Itaici nasce a convicção da necessidade de se construir um grande mutirão, uma Consulta Popular. Desde o início, a questão colocada não era a simples conquista do Estado através das eleições, mas fundamentalmente a necessidade de permitir que o povo brasileiro tomasse seu destino em suas mãos. Construir com o povo as bases de um projeto de nação. Para isso afirmamos que necessitávamos "refundar a esquerda", pois só assim "refundaríamos o Brasil". O caminho hegemônico, que vinha sendo trilhado, e que tinha como bússola exclusivamente a busca de mais espaço na institucionalidade, através da eleição de vereadores, prefeitos, governadores, senadores e enfim, do presidente, pouco a pouco deixou claro o preço que exigia. A esquerda aumentou sua participação em governos, mas a que preço? Perdemos a referência militante na luta de classes e o horizonte estratégico.

O resgate de valores e práticas militantes - lutadores e lutadoras do povo que trazem consigo a mística, a entrega, a ousadia, a dedicação, o estudo e a disciplina para construir outra sociedade – passou de necessário para urgente, urgentíssimo, ao longo dos anos 2000, principalmente após os dois mandatos do presidente Lula. Nesse processo, um conjunto cada vez maior de lutadores foi percebendo essa necessidade. A fragmentação que existia antes do surgimento do PT, e que de certa maneira se manteve representada através das suas muitas tendências internas, e ainda do PC do B e PCB, dentre outros, veio à tona ao longo da década. Essa divisão de projetos e propostas rumo à construção do Brasil do povo brasileiro se expressou em candidaturas diferentes em 2006, e irá novamente se expressar assim em 2010.

Existe base social popular, lutadores e lutadoras do povo, e mesmo militantes, junto às candidaturas identificadas com a esquerda que se apresentarão para escolha do povo brasileiro em outubro desse ano. Lutadores e lutadoras que aprenderam lutando contra a escravidão, contra a ditadura Vargas e a dos militares/civis de 64, durante a Guerra Fria, contra as ditaduras na América Latina, mas também com as experiências de governos populares e movimentos revolucionários, daqui e de outros continentes. Aprenderam com a atuação do império dos Estados Unidos ao longo do século. Atuação hoje tão visível quanto sempre, haja vista a militarização da ajuda humanitária no Haiti, o golpe de Honduras, as bases militares na Colômbia, seu governo a serviço dos EUA, e o golpe de 2002 na Venezuela. E de outro lado, nesse momento temos oportunidade ímpar de aprender com os governos latino-americanos, que colocam em curso um projeto de integração latino-americana baseado na solidariedade entre os povos, a ALBA (Aliança Bolivariana Para as Américas). Lutadores que aprenderam com a Teologia da Libertação e a prática militante que valoriza a mística, a espiritualidade e a afetividade.

Para os lutadores e lutadoras brasileiras é fundamental aprender com a experiência do governo brasileiro, que deveria ser dos trabalhadores e trabalhadoras, mas não o é. Prefere ser da conciliação, e com isso conforma toda uma militância nessa prática. Prefere ser do Mercosul, e exercer um papel sub-imperialista na América Latina, abrindo caminho para a ganância das multinacionais. Prefere conciliar a ter a coragem que Celso Furtado pediu em janeiro de 2003 na primeira página do primeiro número do jornal Brasil de Fato. Prefere assistência à emancipação.

A esquerda militante, antes de colocar seu sectarismo e vanguardismo em ação, terá de compreender que os demais lutadores e lutadoras do povo, que estão atuando sob o propósito da social-democracia (se tanto!), estão tendo oportunidade de se confrontar com tais distinções de projetos. Além, de como já dito, terem tido vários aprendizados. Se é assim, devemos nos perguntar: porque não está fácil refundar a esquerda e construir como horizonte a Refundação do Brasil?

Parece-nos que mais que ‘ver’, é preciso fortalecer a capacidade de ‘julgar’ e ‘agir’ dos milhares de lutadores e lutadoras do povo. O aprendizado precisa se materializar em nova prática política. Essa prática precisa gerar novos coletivos. Esses coletivos produzirão novos valores e práticas. Esses novos valores e práticas precisam estar conectados com outros coletivos e práticas. Essa força material e espiritual nasce do trabalho de base, do objetivo e clareza da necessidade do Projeto Popular. Aquele trabalho de base de 1997 segue sendo a urgência que temos em 2010.

Esse trabalho de base é para ser feito não só para fora, como fermento na massa, mas também entre nós, lutadores e lutadoras do povo.

O projeto em movimento

Desse trabalho de base nasceu em 1999 a Marcha Popular pelo Brasil, um feito memorável que constituiu um grande exemplo pedagógico. Nasce também a consulta popular na forma de plebiscito, em 2000, sobre as dívidas externa e interna e sobre a base militar que os EUA queriam instalar em Alcântara. Coroando o Grito dos Excluídos e a 3ª Semana Social Brasileira, puxada pelas pastorais sociais e movimentos.

Com essa luta conseguimos barrar a base dos EUA no nosso território. Vitória nossa. Em 2002 realizamos outro plebiscito, dessa vez para barrar a ALCA (Área de Livre Comércio das Américas). Vale lembrar que o neoliberalismo, as mídias, o próprio presidente e mesmo parte da oposição davam como certas sua implementação, estavam dispostos a negociar apenas os termos nos quais a ALCA seria implantada. Nós barramos o pacote tal como veio, não só no Brasil, mas no continente.

Em 2005 a confluência das forças do Projeto Popular avança organizativamente na construção da organização da Assembléia Popular – Mutirão por um novo Brasil, realizando encontro nacional com 8.000 pessoas. Conseguimos também encantoar a Vale do Rio Doce e sua chacina ao meio ambiente e aos trabalhadores com o terceiro plebiscito popular que realizamos em 2007. A empresa, após mudar de nome, segue sendo foco da pressão social.

É preciso que o povo brasileiro construa seu projeto experimentando-o, tentando construí-lo. Ao fazer isso, coloca em movimento suas idéias, anseios e demandas. Seu Projeto, seu aprendizado, se tornará vivência. Será identidade. A solidariedade e capacidade de se indignar são molas propulsoras desse aprendizado. Os lutadores e lutadoras do povo que forem se despertando para a militância em comunhão com a libertação do povo brasileiro se confrontarão com as velhas práticas (paternalismo, caudilhismo, currais eleitorais, assistencialismo, busca de construir a imobilidade via o tutelamento e o "deixa que eu faço", "deixa que o vereador aqui do bairro consegue" (ou "o deputado da nossa categoria"). Esse aprendizado é rico.

Mas também a luta que se trava pelo Projeto Popular pelos que estão embrenhados na disputa institucional precisa avançar em seus aprendizados. Há duas formas de fazer com que isso ocorra. Podemos buscar inserir os militantes que já estão atuando nesse segmento dentro da construção dessa nova estratégia. E outra iniciativa é atuar com coerência na institucionalidade, deslocando quadros políticos que atuem como exemplo pedagógico.

Não nos iludamos. Não há trabalho de base por osmose. Não há permanência da coerência e do respeito ao projeto coletivo maior, fora desse coletivo e dessa centralidade. É preciso organizar os militantes estejam eles atuando em que espaço for. É na célula partidária (no sentido de tomar partido e assumir para si um compromisso que é com o Projeto - chamem esse projeto de Reino de Deus ou de socialismo, traduzido na sua estratégia e na sua tática), que se forma o novo homem e a nova mulher.

Arregacemos as mangas. 2010 não é só eleição, mas também luta

Em setembro de 2010 teremos mais um plebiscito popular. Esse, como os demais, toca em um ponto fundamental se queremos refundar o Brasil em novas bases: o limite da propriedade da terra e a reforma agrária. Motivo do acirramento da disputa entre o projeto das elites e o popular ao longo dos séculos na história brasileira, igualmente vivo e significativo nos dias de hoje. Em 2010 teremos também uma marcha das mulheres, de 8 a 18 de março, entre Campinas e São Paulo. Será ainda o ano da II Assembléia Popular Nacional, de 25 a 28 de maio.

Como vemos, elevar nosso próprio nível de consciência, através da formação, nossa capacidade de trabalho de base e de lutas que garantam conquistas para o povo (hoje somos 14 milhões de brasileiros que passam fome, milhares de sem teto, sem terra, sem universidade, sem trabalho, mulheres mercadoria, crianças que não deveriam ser "de rua"), é nossa tarefa para 2010 e até que nós tenhamos o nosso destino em nossas mãos. Até que um verdadeiro Projeto Popular se realize, e seja o motor, prática e identidade dessa nação.

Frederico Santana Rick é cientista social e militante da Consulta Popular e da Assembléia Popular.

O Capital

AOS ESFARRAPADOS DO MUNDO


AOS ESFARRAPADOS DO MUNDO
E AOS QUE NELES SE
DESCOBREM E,
ASSIM
DESCOBRINDO-SE,
COM ELES
SOFREM,
MAS, SOBRETUDO,
COM ELES LUTAM.

- Paulo Freire

...não vou mais me decepcionar com nada.

não quero passar
meus melhores anos esperando que eles cheguem
vou parar
de tentar levar o mundo sobre os meus ombros

não vou mais viver com algo que não vale a pena
vou deixar o vento soprar

sem tentar prever
não vou mais me decepcionar com nada
sem tentar prever
não vou mais me decepcionar com nada

(O tranquêra - Superguidis)

Estou exausto...

"Estou exausto de construir e demolir fantasias. Não quero me encantar com ninguém."

(Caio Fernando Abreu)

terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

Ah, como é bom voar.


Como um brotinho de feijão, foi que um dia eu nasci. Despertei, cai no chão e com as flores cresci. E decidi que a vida logo me daria tudo, se eu não deixasse que o medo me apagasse no escuro. Quando mamãe olhou pra mim, ela foi e pensou, que um nome de passarinho me encheria de amor. Mas passarinho, se não bate a asa logo pia, e eu, que tinha um nome diferente, já quis ser maria. Ah, como é bom voar.

(Passarinho - Tiê)

Obs. Imagem do anime Elfen Lied.

Te Valorizo

Se eu pudesse mostrar o que você me deu, eu mandava embrulhar, chamaria de meu. Melhor forma não há pra guardar um amor, então preste atenção, ou me compre uma flor. Vem, me faz um carinho, me toque mansinho, me conte um segredo ou me enche de beijo. Depois vá descansar, outra forma não há. Como eu te valorizo, eu te espero acordar. Se eu ousar te contar o que eu sonhei, pode até engasgar. Pagaria pra ver. Melhor forma não há pra provar meu amor, eu te presto atenção, tento ser sua flor. Vem, te faço um carinho, eu te toco mansinho, te conto um segredo ou te encho de beijo. Depois vou descansar, não vou te acompanhar. Espero que entenda e volte pra cá.

(Te Valorizo - Tiê)


uma vaga ainda não preenchida


"Não durma mais com aquele urso velho de pelúcia. Ele te dá alergia e ocupa uma vaga ainda não preenchida."

Mais arte erótica. Do site Erotica.







Mais arte erótica. Do site Erotica.











Mais arte erótica. Do site Erotica.





- Dorme, só existe o sonho. Dorme, meu filho. Que seja doce.

"Os dragões não permanecem. Os dragões são apenas a anunciação de si próprios. Eles se ensaiam eternamente, jamais estréiam. As cortinas não chegam a se abrir para que entrem em cena. Eles se esboçam e se esfumam no ar, não se definem. O aplauso seria insuportável para eles: a confirmação de que sua inadequação é compreendida e aceita e admirada, e portanto - pelo avesso igual ao direito - incompreendida, rejeitada, desprezada. Os dragões não querem ser aceitos. Eles fogem do paraíso, esse paraíso que nós, as pessoas banais, inventamos - como eu inventava uma beleza de artifícios para esperá-lo e prendê-lo para sempre junto a mim. Os dragões não conhecem o paraíso, onde tudo acontece perfeito e nada dói nem cintila ou ofega, numa eterna monotonia de pacífica falsidade. Seu paraíso é o conflito, nunca a harmonia.

Quando volto apensar nele, nestas noites em que dei para me debruçar à janela procurando luzes móveis pelo céu, gosto de imaginá-lo voando com suas grandes asas douradas, solto no espaço, em direção a todos os lugares que é lugar nenhum. Essa é sua natureza mais sutil, avessa às prisões paradisíacas que idiotamente eu preparava com armadilhas de flores e frutas e fitas, quando ele vinha. Paraísos artificiais que apodreciam aos poucos, paraíso de eu mesmo - tão banal e sedento - a tolerar todas as suas extravagâncias, o que devia lhe soar ridículo, patético e mesquinho. Agora apenas deslizo, sem excessivas aflições de ser feliz.

As manhãs são boas para acordar dentro delas, beber café, espiar o tempo. Os objetos são bons de olhar para eles, sem muitos sustos, porque são o que são e também nos olham, com olhos que nada pensam. Desde que o mandei embora, para que eu pudesse enfim aprender a grande desilusão do paraíso, é assim que sinto: quase sem sentir.

Resta esta história que conto, você ainda está me ouvindo? Anotações soltas sobre a mesa, cinzeiros cheios, copos vazios e este guardanapo de papel onde anotei frases aparentemente sábias sobre o amor e Deus, com uma frase que tenho medo de decifrar e talvez, afinal, diga apenas qualquer coisa simples feito: nada disso existe.

Nada, nada disso existe.

Então quase vomito e choro e sangro quando penso assim. Mas respiro fundo, esfrego as palmas das mãos, gero energia em mim. Para manter-me vivo, saio à procura de ilusões como o cheiro das ervas ou reflexos esverdeados de escamas pelo apartamento e, ao encontrá-los, mesmo apenas na mente, tornar-me então outra vez capaz de afirmar, como num vício inofensivo: tenho um dragão que mora comigo. E, desse jeito, começar uma nova história que, desta vez sim, seria totalmente verdadeira, mesmo sendo completamente mentira. Fico cansado do amor que sinto, e num enorme esforço que aos poucos se transforma numa espécie de modesta alegria, tarde da noite, sozinho neste apartamento no meio de uma cidade escassa de dragões, repito e repito este meu confuso aprendizado para a criança-eu-mesmo sentada aflita e com frio nos joelhos do sereno velho-eu-mesmo:

- Dorme, só existe o sonho. Dorme, meu filho. Que seja doce.

Não, isso também não é verdade."

(Caio Fernando Abreu)

Construção!

Construção
(Chico Buarque)

Amou daquela vez como se fosse a última
Beijou sua mulher como se fosse a última
E cada filho seu como se fosse o único
E atravessou a rua com seu passo tímido
Subiu a construção como se fosse máquina
Ergueu no patamar quatro paredes sólidas
Tijolo com tijolo num desenho mágico
Seus olhos embotados de cimento e lágrima
Sentou pra descansar como se fosse sábado
Comeu feijão com arroz como se fosse um príncipe
Bebeu e soluçou como se fosse um náufrago
Dançou e gargalhou como se ouvisse música
E tropeçou no céu como se fosse um bêbado
E flutuou no ar como se fosse um pássaro
E se acabou no chão feito um pacote flácido
Agonizou no meio do passeio público
Morreu na contramão atrapalhando o tráfego

Amou daquela vez como se fosse o último
Beijou sua mulher como se fosse a única
E cada filho como se fosse o pródigo
E atravessou a rua com seu passo bêbado
Subiu a construção como se fosse sólido
Ergueu no patamar quatro paredes mágicas
Tijolo com tijolo num desenho lógico
Seus olhos embotados de cimento e tráfego
Sentou pra descansar como se fosse um príncipe
Comeu feijão com arroz como se fosse o máximo
Bebeu e soluçou como se fosse máquina
Dançou e gargalhou como se fosse o próximo
E tropeçou no céu como se ouvisse música
E flutuou no ar como se fosse sábado
E se acabou no chão feito um pacote tímido
Agonizou no meio do passeio náufrago
Morreu na contramão atrapalhando o público

Amou daquela vez como se fosse máquina
Beijou sua mulher como se fosse lógico
Ergueu no patamar quatro paredes flácidas
Sentou pra descansar como se fosse um pássaro
E flutuou no ar como se fosse um príncipe
E se acabou no chão feito um pacote bêbado
Morreu na contra-mão atrapalhando o sábado

Por esse pão pra comer, por esse chão prá dormir
A certidão pra nascer e a concessão pra sorrir
Por me deixar respirar, por me deixar existir,
Deus lhe pague
Pela cachaça de graça que a gente tem que engolir
Pela fumaça e a desgraça, que a gente tem que tossir
Pelos andaimes pingentes que a gente tem que cair,
Deus lhe pague
Pela mulher carpideira pra nos louvar e cuspir
E pelas moscas bicheiras a nos beijar e cobrir
E pela paz derradeira que enfim vai nos redimir,
Deus lhe pague

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

.:acontece de novo:.

"Amanhã, depois, acontece de novo, não fecho nada, não fechamos nada, continuamos vivos e atrás da felicidade."

(Caio Fernando Abreu)

It's my birthday but I don't know what to do.


It's my birthday but I don't know what to do.

“Onde andará?”


“Onde andará?” é das perguntas mais tristes que conheço, sinônimo de se perdeu.

(Caio Fernando Abreu)

domingo, 21 de fevereiro de 2010

Identidade e Luta de Classes

Os pós-modernos, induzidos pelo processo de individualização humana cada vez mais crescente no capitalismo apegam-se ao conceito de identidade com a clara intenção de colocá-lo em destaque, sobrepondo-o ao conceito de classe social. Sem dúvida, é uma maneira sutil de reavivar o revisionismo metafísico, político e filosófico do final do século 19, quando ocorreu a primeira crise de estagnação do capitalismo. Naquele período (1873 – 1898) bastaram duas décadas e meia para que as várias correntes de pensamento, até então alinhadas ao marxismo, rompessem com ele e passassem a defender a via da luta político-institucional pacífica, como meio para a transformação da sociedade capitalista.

A tese da teoria marxista centrada nas leis fundamentais da dialética, principalmente a da negação da negação, quantidade e qualidade, unidade e luta dos contrários, abstrato e concreto etc. que nos possibilita ver as identidades de gênero, de idade, de etnia, de cultura, a subjetividade e quantas outras possam ser privilegiadas nas discussões atuais, no processo de transformação da sociedade – relacionadas e submetidas à identidade de classe – de exploradores e explorados – e pela oposição e luta entre elas – de um lado as forças que impõem a ordem e de outro as que se colocam contra ela, procurando subvertê-la, negando-a, e ao mesmo tempo, como forma de superação, afirmando outra ordem. As identidades de classe possuem uma conexão estreita que possibilitam passar de um estado para outro através do movimento das contradições. A negação coloca as contradições em estágios mais elevados de qualidade, quando as identidades trocam de condição como é o caso da classe trabalhadora que, ao negar a classe burguesa dominante, através do conflito e da não conciliação, assume o lugar de dominante com novas contradições tendo o Estado também como instrumento, mas, colocando acima dele a “ditadura do proletariado”, ou se quisermos, a ordem democrática da maioria contra a minoria.

A tese da confirmação da existência fundamental da classe é que orienta esta nova identidade. E não como fazem os revisionistas quando afirmam que “A nova filosofia da História tem seu cerne na substituição da luta de classes pelo amor para o tempo como motor da história moderna (…)”. A “nova metodologia” não vai além da substituição do que dominam de objetivismo de O Capital, por um subjetivismo por ele proposto. A “nova ética” nada mais é que a proposta de uma revolução passiva a partir da redução do comunismo a um estilo de vida alternativo que se pode afirmar no interior do capital (…). Isto porque, para que os dominados se emancipem, precisam formar e organizar a sua classe, reconhecer a existência de seu oposto que é a classe dominante, e, a partir disso, procurar, através da luta, ocupar o seu lugar, ultrapassar a natureza da dominação burguesa, minoritária, e instituir a democracia da maioria para a maioria, pondo em movimento a lei dialética da quantidade e qualidade. Uma classe é a condição para a existência da outra na luta da própria superação. Como não pode haver capitalismo sem classes, ao estabelecer a luta contra a classe dominante atual, a classe trabalhadora pretende ser vitoriosa, tornando-se dominante. Neste sentido, há, a partir da ruptura entre as duas grandes classes, um aprimoramento na organização, elevação do nível de consciência e melhora nas relações sociais e de solidariedade entre os componentes da classe, que mais adiante deverá também ser extinta.

(Ademar Bogo – Identidade e Luta de Classes)